Ter
sido aluna de escola pública não fazia de Joyce Vieira de Castro Marra,
26 anos, uma minoria representativa dentro da universidade. O que mais
tornava rara a presença da aluna de pedagogia na instituição federal
que cursou era a cor da pele. Formada em 2008, quando 7,7% dos negros
alcançavam o ensino superior no Brasil, a atual professora representa
um avanço nas políticas de igualdade racial no país. Isso porque 20
anos antes apenas 1,8% dos negros cursavam uma faculdade. Apesar do
aumento no acesso à educação, a disparidade em relação aos brancos
ainda assusta.
Essa é uma das conclusões de um estudo apresentado ontem pela Organização das Nações Unidas (ONU) na Comissão de Legislação participativa da Câmara dos Deputados. Organizado em parceria com o Laboratório de Análises Econômicas, Históricas, Sociais e Estatísticas (Laeser) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o Relatório das Desigualdades Raciais no Brasil 2009-2010 analisa como garantias constitucionais, como educação, saúde e previdência social, têm chegado a negros e brancos no país. E alerta: a desigualdade no Brasil diminuiu, mas ainda continua grande.
"O país avançou muito na universalização do ensino, por exemplo, mas a educação ainda chega de forma diferente para brancos, pardos e negros", destaca a pesquisadora do Laeser Irene Rossetto. Ela usa dados para exemplificar a constatação. Em 1988, ano em que a Constituição Federal foi aprovada, 20% das crianças com 6 anos não frequentavam a escola. Essa taxa hoje é de apenas 6,4%. Analisando mais de perto o cenário, entretanto, é possível ver a diferença. Enquanto 4,8% das crianças brancas nessa faixa etária estão fora da escola, 7,5% das crianças pretas e pardas encontram-se nessa situação.
Mesmo entre os que têm acesso ao ensino há disparidades. Quando considerada a taxa de adequação, se o estudante está na série indicada para a sua idade, os negros continuam atrás. De uma forma geral, entre os jovens com 15 a 17 anos que deveriam estar no ensino médio, a taxa é de 34%. Se consideramos apenas os brancos, fica em 26,2%. No caso dos pretos e pardos, 20,1%.
Irene Rossetto destaca que os problemas atingem todas as etnias, mas alcançam de forma mais acentuada os negros. "A qualidade desse ensino é diferente. Até a estrutura e a segurança das escolas onde estudam (os negros) costumam ser inferiores", analisa. Segundo ela, é fundamental que sejam aplicadas políticas afirmativas para reduzir ainda mais as desigualdades. "É preciso levar em conta que os negros partem de posições iniciais muito diferentes devido à dívida histórica que carregam. É preciso ter políticas que garantam não apenas cotas de participação, mas uma mudança no olhar, para que passem a ser vistas as limitações específicas", defende.
Estar na universidade propiciou que Joyce tivesse essa nova perspectiva. Para ela, ter cursado a universidade garantiu não apenas uma profissão, mas o reconhecimento de sua raça. "Antes, eu achava que era morena. Foi na faculdade que tive contato com a desmistificação da beleza padrão", explica. Quanto a eventuais episódios de preconceito, a pedagoga não dramatiza. "Não gosto dessa coisa de mania de perseguição que alguns têm. Nunca fui impedida de entrar em algum lugar ou coisa do tipo. Mas a gente sente a discriminação de uma forma mais sutil", lembra. "Quando alguém perguntava onde eu estudava e eu dizia que era na Universidade de Brasília, as pessoas se assustavam e perguntavam como eu tinha conseguido."
Segundo Rebeca Tavares, representante da ONU Mulher, o relatório é um primeiro passo para diagnosticar a situação do país, mas ela afirma que a caminhada ainda é grande. "Sem o diagnóstico, é impossível propor políticas públicas que possam resolver o problema. Mas é preciso ser mais incisivo para acabar com o preconceito, ainda forte, persistente e universal", avalia.
Baseado na Magna Carta
Esta é a segunda edição do Relatório Anual das Desigualdades Raciais no Brasil. Ele compila e analisa dados oficiais de órgãos como o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O novo número analisou como a Constituição de 1988 influenciou a evolução das desigualdades, já que, do ponto de vista social, ela é considerada progressista. Um de seus princípios fundamentais é "promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação".
Em queda
As disparidades raciais têm diminuído no Brasil, mas continuam grandes, segundo documento divulgado ontem pela Organização das Nações Unidas (ONU)
Essa é uma das conclusões de um estudo apresentado ontem pela Organização das Nações Unidas (ONU) na Comissão de Legislação participativa da Câmara dos Deputados. Organizado em parceria com o Laboratório de Análises Econômicas, Históricas, Sociais e Estatísticas (Laeser) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o Relatório das Desigualdades Raciais no Brasil 2009-2010 analisa como garantias constitucionais, como educação, saúde e previdência social, têm chegado a negros e brancos no país. E alerta: a desigualdade no Brasil diminuiu, mas ainda continua grande.
"O país avançou muito na universalização do ensino, por exemplo, mas a educação ainda chega de forma diferente para brancos, pardos e negros", destaca a pesquisadora do Laeser Irene Rossetto. Ela usa dados para exemplificar a constatação. Em 1988, ano em que a Constituição Federal foi aprovada, 20% das crianças com 6 anos não frequentavam a escola. Essa taxa hoje é de apenas 6,4%. Analisando mais de perto o cenário, entretanto, é possível ver a diferença. Enquanto 4,8% das crianças brancas nessa faixa etária estão fora da escola, 7,5% das crianças pretas e pardas encontram-se nessa situação.
Mesmo entre os que têm acesso ao ensino há disparidades. Quando considerada a taxa de adequação, se o estudante está na série indicada para a sua idade, os negros continuam atrás. De uma forma geral, entre os jovens com 15 a 17 anos que deveriam estar no ensino médio, a taxa é de 34%. Se consideramos apenas os brancos, fica em 26,2%. No caso dos pretos e pardos, 20,1%.
Irene Rossetto destaca que os problemas atingem todas as etnias, mas alcançam de forma mais acentuada os negros. "A qualidade desse ensino é diferente. Até a estrutura e a segurança das escolas onde estudam (os negros) costumam ser inferiores", analisa. Segundo ela, é fundamental que sejam aplicadas políticas afirmativas para reduzir ainda mais as desigualdades. "É preciso levar em conta que os negros partem de posições iniciais muito diferentes devido à dívida histórica que carregam. É preciso ter políticas que garantam não apenas cotas de participação, mas uma mudança no olhar, para que passem a ser vistas as limitações específicas", defende.
Estar na universidade propiciou que Joyce tivesse essa nova perspectiva. Para ela, ter cursado a universidade garantiu não apenas uma profissão, mas o reconhecimento de sua raça. "Antes, eu achava que era morena. Foi na faculdade que tive contato com a desmistificação da beleza padrão", explica. Quanto a eventuais episódios de preconceito, a pedagoga não dramatiza. "Não gosto dessa coisa de mania de perseguição que alguns têm. Nunca fui impedida de entrar em algum lugar ou coisa do tipo. Mas a gente sente a discriminação de uma forma mais sutil", lembra. "Quando alguém perguntava onde eu estudava e eu dizia que era na Universidade de Brasília, as pessoas se assustavam e perguntavam como eu tinha conseguido."
Segundo Rebeca Tavares, representante da ONU Mulher, o relatório é um primeiro passo para diagnosticar a situação do país, mas ela afirma que a caminhada ainda é grande. "Sem o diagnóstico, é impossível propor políticas públicas que possam resolver o problema. Mas é preciso ser mais incisivo para acabar com o preconceito, ainda forte, persistente e universal", avalia.
Baseado na Magna Carta
Esta é a segunda edição do Relatório Anual das Desigualdades Raciais no Brasil. Ele compila e analisa dados oficiais de órgãos como o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O novo número analisou como a Constituição de 1988 influenciou a evolução das desigualdades, já que, do ponto de vista social, ela é considerada progressista. Um de seus princípios fundamentais é "promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação".
Em queda
As disparidades raciais têm diminuído no Brasil, mas continuam grandes, segundo documento divulgado ontem pela Organização das Nações Unidas (ONU)