Uma avaliação realizada por senadores,
especialistas e militantes do movimento negro sobre os 10 anos do
sistema de cotas afirma que a ação afirmativa mostrou ser bem sucedida
ao promover significativa e relevante inclusão da população negra
brasileira nas universidades públicas.
Segundo eles, as cotas são um instrumento
legítimo para a busca da “igualdade material” preconizada pela
Constituição de 1988. O grupo também argumentou a favor de programas
como o Prouni e o Fies que, em sua opinião, proporcionam o acesso ao
ensino superior a parcelas populacionais que historicamente ficaram de
fora das universidades.
A primeira lei, a 3.708/01, foi
implantada no Rio de Janeiro, e assegurou 40% das vagas aos estudantes
afrodescendentes em escolas de ensino superior do Estado. Hoje, são
cerca de 110 mil cotistas negros em 32 universidades estaduais e 38
universidades federais de todo o país. Para ser beneficiado com o
sistema de cotas, o aluno deve se declarar como negro ou pardo e provar
com fotos anexadas à matrícula.
Resultado ainda longe do ideal
– Luís Fernando Olegar, coordenador do departamento de educação do
Movimento da Consciência Negra do Vale do Itapocu (Moconevi) considera o
preconceito contra afrodescendentes e o sistema de cotas resultado da
falta de informação. “As pessoas não têm acesso à educação de forma
igualitária”, explica o diretor, que já trabalhou em duas instituições
em bairros de classes sociais bem diferentes.
“Enquanto as crianças de uma escola
tinham em casa acesso à internet, TV a cabo, viajavam para outras
cidades e conheciam lugares dos quais tinham aprendido na sala de aula,
as outras só tinham como o passeio do ano uma ida ao shopping, quando a
escola as levava”, conta.
Para o professor, as cotas raciais são um
“reparo necessário, um caminho inverso ao mal feito aos negros ao longo
da história do Brasil”. O educador entende o argumento de alguns
grupos, inclusive da própria comunidade afrodescendente, sobre a
importância de cotas para os menos favorecidos economicamente e não
somente para os de cor escura. Porém, ele acha imprescindível o
benefício para os negros devido ao racismo. “Os negros sofrem
preconceito não pela classe social ou pelo currículo. Na hora de uma
entrevista para emprego, o fenótipo é o que conta. As pessoas são
escolhidas pelo que mostram, pela cor e pelos traços”, defende.
Segundo o educador, quanto maior o nível
de formação acadêmica do negro, mais ele sofre racismo. “O peso é maior.
Há mais cobrança para os que não tinham vez, principalmente os
cotistas”, afirma. “As cotas permitem a ascensão social de um grupo
étnico cuja maioria não tem oportunidade de crescer na vida”.
Falta de representatividade
– Além do desenvolvimento social dos afrodescendentes, o coordenador
considera a visibilidade um fator importante na luta contra o racismo.
“Se a criança não vê professores, médicos, empresários, enfim, pessoas
bem sucedidas da mesma cor, ela aprende que aquilo é normal e cresce
inconscientemente com um sentimento de inferioridade” explica. “Você não
se enxerga, não se sente representado”.
Apesar de toda a mobilização dos
movimentos que lutam pelos direitos de igualdade dos afrodescendentes, a
disseminação de sua cultura e a formação de lideranças, para Luís
Fernando, a mudança social foi pequena após uma década de cotas raciais.
O professor dá um exemplo da discriminação em exercícios feitos em sala
de aula com os alunos: “há dez anos, pedia para as crianças procurarem
em revistas pessoas negras. Encontravam poucas. Hoje, fico assustado aos
constatar que isso não mudou”, conta. “Mesmo os pretos e pardos serem
praticamente metade da população brasileira, a representatividade na
mídia ainda é muito pequena”.
Luís Fernando espera que um dia as cotas
raciais, e qualquer tipo de cota, não sejam mais necessárias. “O ideal é
que deixem de existir e todos vivam em condição de igualdade”, conclui.
Fonte: Correio do Povo
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