terça-feira, 17 de maio de 2011

A linda barbárie na Semana do Teatro sem platéia

por andré Lisboa: do Blog Diário do andré:

 diário do andré (clique e leia )
Atos de protestos, vaias, flores, palavrões, cobranças a revelação do planejamento de um segundo atentado à base de merda e começou a Semana do Teatro do Maranhão. Lindo! Verdadeiramente completo. Um evento para artistas marginalizados que se apresentam a um público quase inexistente, para uma cidade que não está nem aí para o que é espetáculo, principalmente se tiver origem aqui.
Um festival mantido de forma irregular e amadora – sem planejamento – pelo Governo do Estado e, principalmente, sem a menor perspectiva de lucro ou mínima de sustentabilidade.
No momento em que a comissão organizadora começou a falar, um ator que estava no balcão do teatro começou a criticar em voz alta. Uma atitude extremamente esperada de uma classe artística que vê no protesto sóbrio e sem danos a melhor forma de se expressar. A cultura não está sendo valorizada. A arte não é valorizada. Um senso geral e uma vontade comum. Celebremos a selvageria artística. Ela tem sua necessidade de existência.
Ataques ao Governo do Estado por ter acertado contrato que – segundo dizem – gira em torno de R$ 1 milhão – com a Escola de Samba Beija-Flor para homenagear os 400 anos de São Luís no próximo Carnaval do Rio. O que seria uma estratégia de marketing e propaganda para as comemorações do quatrocentenário da ilha que um dia afundará por sua hipócrita relação com meio.
Ontem, na abertura, as vaias caíram sobre o Secretário de Estado de Cultura, Luís Bulcão, e a comissão organizadora da Semana de Teatro, e principalmente o diretor do Teatro, Roberto Brandão. Excelente! O governo está aí para ser cobrado mesmo. Sem restrições, sem comodismo. De uma arte que se conforma com seu É claro, eles têm as suas falhas. Vacilaram ao levantar números, ao defender investimentos, que todos sabem que não podem agradar a todos, que não tem condição de satisfazer ao comodismo de todo e qualquer um que se autodenomina artista no estado. O próprio Bulcão disse que esperava uma manifestação como aquela e que ela era válida porque era de origem artística. “O teatro é um espaço democrático e a arte tem que ser livre”, disse.
Há falhas, há uma política de prioridades e de favorecimento, contudo há a má educação e ela é uma vergonha. Xingar não traz resultado nenhum. Fazer fuxico, jogar merda na platéia não aumenta o público. Traz má fama. O mela-mela é uma prática não muito aceita fora do Carnaval. Foi descoberta, um dia depois do histórico atentando com fezes contra a platéia do Teatro Arthur Azevedo, no espetáculo “Raimundo – Meu nome é humor”, outro pacote cheio de bosta dentro de uma das caixas de mangueira de incêndio da casa de espetáculo. E quanto a isso ninguém falou. O constrangimento foi geral quando as rosas – em ato de desagravo – caíram sobre a platéia.
Porém não houve um protesto, um ato, uma manifestação, nenhum um grito de artista chamando o público da rua para lotar os espaços do teatro. Nada. Como disse Urias de Oliveira, a coisa não bate, na gruda nas pessoas. Não houve platéia para abertura da Semana do Teatro ontem. Culpa do governo que não investiu, gritaria qualquer um mais afobado e mais politizado. Porém a culpa é também da falta de qualidade artística de muitos, do distanciamento das peças das platéias. Há séculos o teatro era feito por meio de companhias que circulavam por diversos locais, cidades, estados, países, indo atrás do seu público apresentando sua arte a quem quisesse ver e pagar. Centenas de pessoas vão aos semáforos mostrar seus malabares e ali ganhar uns trocados, que podem se somar em uma boa quantia no fim do dia. “O artista tem de ir aonde o povo está”, canta há muito tempo Milton Nascimento.
O Estado já está lá mantendo um grande teatro, um grande teatro para poucos. Se ele não existisse, cobrariam a sua construção. Construído não há pessoas que o lotem. Ontem, o que se viu foi um espaço esvaziado, com poucos alunos do curso de teatro, poucos professores, poucos atores. A platéia estava quase cheia, mas as frisas, os balcões e as galerias. Um evento sem comoção para uma classe artística que ainda não cativa, para um público que não reflete. Isso sim deveria ser um ato de protesto. Deveria fazer parte das manifestações de revolta, deveria estar em um momento de reflexão da própria produção.
Em São Luís, há uma produção cultural que ainda se vê sustentada por políticas assistencialistas do poder público – prefeitura e governo do estado -, que, seguindo uma estratégica de caráter populista e justificativa demográfica, investe prioritariamente em ações e eventos de manifestação popular. Quando chega o Carnaval arregimenta-se todo e qualquer artista de música (qualquer o ritmo que seja) para trepar em um palco. Ele vai atrás da arte? Vai mostrar sua arte? Não, vai em busca do cachê. O C.N.PJ dos artistas maranhenses tem servido apenas para garantir o acesso a grana dos governos. Pensar estratégias empresariais para manter a arte ninguém quer.
Uma política estabelecida há alguns anos, com grande investimento de dinheiro público nos grupos de bumba-meu-boi e à qual muitos – quase toda a classe artística, com algumas exceções – ficaram viciados e se acham no direito de cobrar recursos públicos em um estado onde milhares pessoas passam fome, não tem educação e muito menos saúde.
Artistas maranhenses não sabem os caminhos para garantir a sua própria grana e insistem em pedir ao governo, que investe mais, com critérios políticos e econômicos, na cultura popular. O teatro nunca foi e nem será prioridade. A cena se repete a cada dia. Repete-se com atos políticos vestidos de artistas. Com estratagemas políticas revestidas de investimento cultural.
Não apoio investimento desvairado do estado em cultura, exceto na manutenção estrutural, nas ações de formação, de criação de base. Apóio ações de fomento de caráter empresarial para a criação de um mercado cultural autossutentável. Penso em exemplos como o Festival Nacional de Teatro de Guaramiranga e o Festival de Cinema de Gramado.
Muitos vêm levantar a constituição e dizer que está gravada nela a ordem ao Estado de financiar a cultura. Ora, me dêem aqui uma definição de cultura. Tenho certeza de que será tão abrangente que não se levada ao tribunal haveria uma guerra sem fim.
Não existe apenas o dinheiro público para manter a arte. A arte criada com grana do governo é arte do governo e não arte em si libertária. Maiakóvski foi morto pelo governo que sua arte defendeu. O teatro não precisa de dinheiro público para existir. Arte não precisa de dinheiro público para existir. Uma visão muito romântica? Ora, ora, porém há muito de pragmatismo também. Menos hipocrisia, mais subversão e barbárie artística, mais atos de protestos unicamente com o princípio da crítica ao governo, de manuntenção de uma tão romantizada – aí, sim – liberdade.
 
fonte: Blog de Artes Cênias MA (aqui)

0 comentários:

Postar um comentário