Joãozinho Ribeiro
A impressão que tenho, sempre que me deparo com as imagens na tela da TV no horário gratuito reservado à propaganda partidária, é de alguém confessando publicamente alguma espécie de crime ainda não tipificado pelo Direito Eleitoral. Monteiro e Washington – um presidente, outro vice-governador – justificando o apoio à governadora Roseana Sarney, protagonizam uma cena que nem mesmo o realismo fantástico da literatura latino-americana seria capaz de conceber.
Não representam mais o passado, muito menos o presente e jamais o futuro de qualquer cenário político que se possa imaginar de mudança social ou de poder em nosso Estado. São como personagens desovados numa trilha onde perderam definitivamente o prumo, o rumo ou qualquer outra reserva, que por ventura algum dia tiveram de conteúdo ético e moral, no que diz respeito à legitimação política.
Fazem parte de um enredo descomunal de desconstrução de um patrimônio político que não lhes pertencia, mas que dilapidaram, em conluio com as forças oligárquicas da capitania hereditária do Maranhão, a troco de migalhas de um poder, cujo núcleo decisório jamais compartilharão.
Não por demérito de suas personalidades, perfeitamente adequadas para o papel que lhes foi confiado, como atores que nem mesmo chegaram à condição de coadjuvantes de tão estapafúrdia novela, porém figurantes de uma mega produção em cuja direção se encontra o dono de suas próprias almas, conduzindo-as, com maestria para o caldeirão de breu, como o barqueiro de Dante.
O óleo fervente, quem sabe, poderá redimir alguns pecados, mas a história, sempre impiedosa, não lhes absolverá. Por mais esforço que empreendam, conclamando novos seguidores, a troco de cargos e benesses temporárias, de pouca monta e de muita cumplicidade com o atraso e com práticas que de há muito infelicitam o nosso Maranhão.
Infelizmente, tenho que reconhecer a magnitude dos danos irreparáveis cometidos neste processo pelo Partido dos Trabalhadores e a responsabilidade pelos que ainda estão por vir. Porque não há nada pior para os setores progressistas numa sociedade politicamente organizada e para a autonomia dos movimentos sociais que levaram anos para se estruturar, do que as ações de cooptação dos comunistas arrependidos, convertidos a um novo credo, totalmente antagônico ao que antes era professado por eles antes, ainda que não concordássemos com eles. Creiam: o estrago é imensurável.
Não faço coro à cantilena das forças conservadoras que imputam aos governos Lula toda responsabilidade pelo atual déficit de legitimação democrática e de participação popular, até porque estas mesmas forças nunca tiveram nenhum compromisso com a democracia, e muitos dos seus representantes escondem os dedos e as mãos sujas de sangue de muita gente morta e torturada durante a ditadura militar.
Por outro lado, entendo que a independência e a autonomia dos movimentos sindical, social e popular pagaram um preço alto neste processo, em que a própria solidariedade que sempre foi a tônica de suas ações de resistência, foi escamoteada em recentes movimentos reivindicatórios, como foi o caso das greves de professores estaduais, dos motoristas e cobradores de ônibus de São Luís, quilombolas, policiais civis, etc.
Nenhuma nota da maior central sindical do País, a CUT, e da própria direção estadual do PT foi emitida. Isso tudo é preocupante, diante da aceitação passiva pela população de mandatos conquistados, cada vez mais, a custa de campanhas milionárias, levando para as casas legislativas pessoas que só conseguem representar a si mesmas, sem vínculo nenhum sequer com qualquer segmento social que seja. Isso vale tanto para os candidatos progressistas, quanto para os conservadores. Tanto para a esquerda e seus extremos, quanto para a direita e os reacionários. A despolitização resulta na aparição dos fundamentalismos inconseqüentes de todos os matizes: ideológicos, políticos e ideológicos.
É nesta nefasta permissividade, em nossa terra chancela pelo silêncio dos intelectuais, que o vice-governador navega, tendo o cinismo político de propor candidatura própria do PT às eleições municipais de São Luís em 2012, fazendo dobradinha com o PMDB, na tentativa de misturar uma biografia irretocável de uma pessoa como Bira do Pindaré com a do atual deputado estadual Roberto Costa.
Não imagino qual será o desfecho desta demoníaca comédia. Só sei que o barqueiro continuará remando e transportando os passageiros, com seus respectivos passaportes, para as profundezas daquele lugar, de onde ninguém tem registro de alguém que tenha retornado.
Joãozinho Ribeiro
poeta/compositor
poeta/compositor
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