FONTE: O Imparcial |
Em menos de cinco minutos, 16 jovens com idades entre 13 e 16 anos foram encontrados trabalhando na feira livre do bairro São Francisco, ontem. Situação comum e número que chega a dobrar, dependendo do movimento, segundo o articulador social da Secretaria Municipal da Criança e Assistência Social (Semcas), Iran Alves da Silva. São nas feiras livres e mercados que ele e outros 15 monitores da entidade se concentram para mapear estes menores. O trabalho consiste em anotar dados que serão enviados à uma equipe técnica que avaliará a situação e encaminhará o jovem para o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI).
A ação é permanente, mas, desde o início da semana passada as equipes intensificaram o trabalho como parte de atividades do Dia Mundial de Combate ao Trabalho Infantil, lembrado hoje, como protesto contra este tipo de trabalho que expõe crianças a longas jornadas e em condições perigosas. Este ano, a campanha trabalha o tema “Trabalho infantil: deixar de estudar é um dos riscos” e foca no trabalho doméstico, informal (nas ruas), agricultura (aplicação de agrotóxico) e no lixo. As equipes da Semcas se concentraram em feiras e mercados de diversos bairros e o balanço do trabalho será feito amanhã. Deste balanço, a entidade pretende traçar um mapa do trabalho infantil em feiras e mercados da capital.
A reportagem encontrou um caso atípico em um estabelecimento comercial no Renascença. Um jovem de 14 anos conta que sempre vai ao local para pedir frutas aos clientes. “Não peço dinheiro porque eles não dão”, diz o menor, que mora com a avó e cursa a 6ª série. A avó, diz ele, passa o dia trabalhando como doméstica em uma casa de família. No Brasil existe 1,5 milhão de crianças e adolescentes submetidas ao trabalho no campo. Outro dado aponta 4,2 milhões de jovens entre 5 e 17 anos trabalhando em 2009. Os dados são da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) do Instituto Nacional de Geografia e Estatística (IBGE).
No Nordeste há maior concentração e no Sul e Centro-Oeste, maior crescimento. Na faixa etária de cinco a 14 anos, o trabalho infantil cresceu em 10,3%, entre 2004 e 2005.
O Maranhão ocupa o 7º lugar entre os estados que mais exploram o trabalho infantil, com 70.751 crianças e jovens entre cinco e 17 anos. Em São Luís , a promoção da educação integral é executado pela Secretaria Municipal de Educação (Semed). No projeto, o jovem divide o tempo entre o estudo e o lazer. Aplicado na escola Odylo Costa Filho, no bairro Alto da Esperança, trouxe como resultado o aumento do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb).
O PETI
O PETI é um programa do governo federal que tem como objetivo retirar as crianças e adolescentes, de 07 a 14 anos, do trabalho considerado perigoso, penoso, insalubre ou degradante, ou seja, aquele trabalho que coloca em risco a saúde e segurança das crianças e adolescentes. A prioridade são famílias com renda per capita de até três salários mínimos.
PERSONAGEM DA NOTÍCIA
Trabalho, estudo e diversão
“Eu ajudo meu avô desde os 13 anos e gosto de ficar aqui com ele. Não atrapalha meu estudo, nem minha vida”, diz *João, 15 anos. Filho mais velho de uma família de quatro irmãos, o jovem divide o tempo entre os estudos na 6ª série que cursa, o trabalho com o avô em uma banca de frutas e a escolinha de futebol que frequenta. Para João, não existe sacrifício. O ganho é revertido à família e por ser o filho mais velho, foi escolhido para a função. O tempo que fica na banca de frutas não dificulta seu processo de aprendizagem. Ele se diz “bom aluno em português, geografia e matemática”. Na sala de aula senta bem na frente porque “gosta de prestar atenção no que a professora ensina”. Já, na escolinha de futebol ele não vai há dois meses, por causa do trabalho. As aulas são dois dias na semana e, às vezes, coincidem com suas atividades na venda de frutas. Mas, João sonha alto. Assim como na escola, ele é destaque no futebol. Sonha ser zagueiro de um grande time, pois, segundo ele, na escola onde treina muitos já foram escolhidos. Seus ídolos são Cristiano Ronaldo (Real Madri) e Davi Luís (Chelsea). João gosta da vida que leva, mas é consciente do que é errado. “Se uma criança ou um jovem ‘tá trabalhando e não pode estudar, eu acho errado. A gente precisa estudar pra ser alguém na vida”, diz, com firmeza o jovem.
*nome fictício
ESPECIALISTA
“As crianças de famílias pobres são as que encabeçam a lista do trabalho infantil. A família vê naquela criança a chance de ter um aumento na renda. A própria criança já entende o peso do trabalho que desenvolve. Ela sabe que tem uma responsabilidade e precisa retornar com algum dinheiro para casa. A maior parte destas crianças não está na escola e se frequenta, chega sempre com atraso, cansado do dia de trabalho, desmotivado e baixo rendimento escolar. Deixam de ser criança muito cedo, porque, com o trabalho que toma o tempo, perde o momento próprio de sua idade e que deve ser vivido. Outro fator complicador é a exclusão destas famílias de programas como o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI) e o Bolsa Família. São propostas que, se não resolvem, atenuam e, ao passo que revertem ganhos às famílias, também cobram que esta criança frequente a escola. O trabalho infantil é proibido por lei e o certo seria que esta criança e sua família tivessem acesso às condições mínimas, para não recorrer a esse meio, que acaba por precarizar o desenvolvimento infantil”.
Lílian Freitas, pedagoga
0 comentários:
Postar um comentário