Uma pesquisa conduzida no Laboratório de Imunologia Celular e Molecular do Instituto de Pesquisa da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC/RS) dá indícios de que uma evolução importante na segurança de transplantes de órgãos e tecidos pode estar prestes a ocorrer. Coordenada pela bióloga Cristina Bonorino, a equipe da PUC gaúcha descobriu que a proteína Hsp70, encontrada no bacilo de Koch (bactéria que provoca a maioria dos casos de tuberculose) e no próprio homem, tem potencial para minimizar a rejeição aos transplantes. Os pacientes que conseguem driblar a morte com órgãos de doadores ficam dependentes dos imunossupressores, drogas que atuam para evitar que o organismo estranhe e ataque o novo órgão. Se o trabalho dos cientistas for bem-sucedido, a prescrição desses medicamentos poderá ser minimizada.
Segundo a coordenadora da pesquisa, a Hsp70 é encontrada em todos os seres vivos, mas foi o clone do gene da Mycobacterium tuberculosis, ou bacilo de Koch, que serviu como fonte para os experimentos do laboratório da universidade gaúcha. Trata-se da proteína mais universal e conservada que existe na natureza e suas propriedades fisiológicas imunossupressoras chamaram a atenção dos pesquisadores. O clone genético da Hsp70 do bacilo é muitíssimo parecido com o do homem e dos camundongos. 'Muitas pessoas se assustam e indagam sobre a possibilidade de contaminação bacteriana no experimento. Extraímos e aplicamos processos que eliminam completamente esse risco', garante Cristina.
A pesquisadora explica que a proteína já vem sendo testada por cientistas de outras partes do mundo por meio de injeções aplicadas em ratos de laboratório. O problema é que, dessa forma, todo o organismo recebe os efeitos imunossupressores, assim como ocorre com pacientes que tomam medicamentos orais com essa propriedade. A resposta imune fica comprometida, deixando os transplantados suscetíveis a infecções. O diferencial do trabalho brasileiro é a busca de uma abordagem local. Estudamos um extrato líquido com a Hsp70, na qual o órgão ou tecido seria preservado imerso até o momento do transplante. A proteína agiria somente na região da parte transplantada, evitando a rejeição e minimizando as doses de imunossupressores ministradas ao paciente antes e depois do procedimento, sugere.
No momento, o grupo da PUC/RS busca entender o mecanismo de ação da proteína, na qual os pesquisadores tentarão isolar o princípio ativo da Hsp70 para o desenvolvimento de uma solução que será testada clinicamente. 'Estamos também conduzindo testes de toxicologia, o que é importante para conseguirmos levar nosso trabalho adiante. Sabemos que as respostas imunes diferem de paciente para paciente. A Hsp70 é expressa por qualquer célula do nosso corpo e seu princípio ativo é o mesmo tanto no homem quanto no bacilo', sustenta. Os resultados conquistados até agora são animadores. Na pesquisa, a proteína foi capaz de prevenir o dano isquêmico da pele enxertada nos ratos. O efeito imunossupressor durou 20 dias, o dobro do grupo de controle, que não utilizou nenhuma substância antes ou depois do enxerto. A pesquisa foi publicada na revista PloS One, da Public Library of Science.
Inibindo as defesas
O coração que bate no peito da dona de casa Maria Pia Barbosa Albuquerque, 54 anos, foi transplantado em maio de 2009. As drogas imunossupressoras que fazem parte da sua rotina começaram a ser ministradas antes mesmo do procedimento que lhe salvou a vida. Os remédios, no entanto, trazem efeitos colaterais. 'Os médicos já minimizaram a dosagem, mas ainda assim sinto dores no estômago, passei a sofrer com dores nas articulações e, como a imunidade fica baixa, devo ter cuidados redobrados com infecções oportunistas. Se tiver febre, preciso ser internada', observa. O novo coração salvou a vida de Maria Pia, mas ele pulsa somente com a permissão dos imunossupressores. 'Não reclamo. Afinal, estou viva, mas sei que, como todo medicamento, essa droga causa efeitos colaterais', diz.
O mesmo ocorre com o pequeno João Pedro Barbosa de Araújo, 4 anos. A vida do garoto foi preservada graças aos rins de um doador. Antes do transplante, ele sobrevivia à base de medicamentos e terapias paliativas. Atualmente, João toma 6mg de imunossupressores diariamente. A cada 30 dias, uma avaliação sanguínea determina se as doses precisam ser alteradas. 'Os transplantes foram um grande avanço da medicina. Minimizar as doses dos imunossupressores aos transplantados seria um grande alívio aos pacientes que vivem uma liberdade vigiada', considera Samuel Barbosa Cruz, pai de João. Segundo ele, o filho não pode frequentar ambientes aglomerados e nem tomar sol. 'A pele fica muito sensível. Se ele não usar protetor, corre o risco de ter câncer de pele. Colocamos João em uma escola e em uma semana ele pegou uma infecção. Todo cuidado é pouco', relata.
Ainda assim, os médicos são unânimes: sem os imunossupressores, não seria possível transplantar órgãos. Fernando Bacal, especialista em transplantes cardíacos do Instituto do Coração da Universidade de São Paulo (USP), reforça que são esses medicamentos que debelam a resposta natural do organismo, impedindo a rejeição. O médico lembra que a técnica ficou estagnada entre as décadas de 1970 e 1980, porque os pacientes morriam justamente devido à rejeição.
'A droga tem evoluído também. Hoje, os medicamentos já provocam menos efeitos colaterais que os usados há três décadas', garante. Cada grupo de imunossupressor atua em vias específicas. Os protocolos variam de acordo com o órgão transplantado e a reação imunológica do paciente. 'Os efeitos colaterais mais graves são insuficiência renal e predisposição ao câncer, mas eles podem ser evitados com o ajuste das doses e eventuais modificações dos medicamentos.'
Segundo a coordenadora da pesquisa, a Hsp70 é encontrada em todos os seres vivos, mas foi o clone do gene da Mycobacterium tuberculosis, ou bacilo de Koch, que serviu como fonte para os experimentos do laboratório da universidade gaúcha. Trata-se da proteína mais universal e conservada que existe na natureza e suas propriedades fisiológicas imunossupressoras chamaram a atenção dos pesquisadores. O clone genético da Hsp70 do bacilo é muitíssimo parecido com o do homem e dos camundongos. 'Muitas pessoas se assustam e indagam sobre a possibilidade de contaminação bacteriana no experimento. Extraímos e aplicamos processos que eliminam completamente esse risco', garante Cristina.
A pesquisadora explica que a proteína já vem sendo testada por cientistas de outras partes do mundo por meio de injeções aplicadas em ratos de laboratório. O problema é que, dessa forma, todo o organismo recebe os efeitos imunossupressores, assim como ocorre com pacientes que tomam medicamentos orais com essa propriedade. A resposta imune fica comprometida, deixando os transplantados suscetíveis a infecções. O diferencial do trabalho brasileiro é a busca de uma abordagem local. Estudamos um extrato líquido com a Hsp70, na qual o órgão ou tecido seria preservado imerso até o momento do transplante. A proteína agiria somente na região da parte transplantada, evitando a rejeição e minimizando as doses de imunossupressores ministradas ao paciente antes e depois do procedimento, sugere.
No momento, o grupo da PUC/RS busca entender o mecanismo de ação da proteína, na qual os pesquisadores tentarão isolar o princípio ativo da Hsp70 para o desenvolvimento de uma solução que será testada clinicamente. 'Estamos também conduzindo testes de toxicologia, o que é importante para conseguirmos levar nosso trabalho adiante. Sabemos que as respostas imunes diferem de paciente para paciente. A Hsp70 é expressa por qualquer célula do nosso corpo e seu princípio ativo é o mesmo tanto no homem quanto no bacilo', sustenta. Os resultados conquistados até agora são animadores. Na pesquisa, a proteína foi capaz de prevenir o dano isquêmico da pele enxertada nos ratos. O efeito imunossupressor durou 20 dias, o dobro do grupo de controle, que não utilizou nenhuma substância antes ou depois do enxerto. A pesquisa foi publicada na revista PloS One, da Public Library of Science.
Inibindo as defesas
O coração que bate no peito da dona de casa Maria Pia Barbosa Albuquerque, 54 anos, foi transplantado em maio de 2009. As drogas imunossupressoras que fazem parte da sua rotina começaram a ser ministradas antes mesmo do procedimento que lhe salvou a vida. Os remédios, no entanto, trazem efeitos colaterais. 'Os médicos já minimizaram a dosagem, mas ainda assim sinto dores no estômago, passei a sofrer com dores nas articulações e, como a imunidade fica baixa, devo ter cuidados redobrados com infecções oportunistas. Se tiver febre, preciso ser internada', observa. O novo coração salvou a vida de Maria Pia, mas ele pulsa somente com a permissão dos imunossupressores. 'Não reclamo. Afinal, estou viva, mas sei que, como todo medicamento, essa droga causa efeitos colaterais', diz.
O mesmo ocorre com o pequeno João Pedro Barbosa de Araújo, 4 anos. A vida do garoto foi preservada graças aos rins de um doador. Antes do transplante, ele sobrevivia à base de medicamentos e terapias paliativas. Atualmente, João toma 6mg de imunossupressores diariamente. A cada 30 dias, uma avaliação sanguínea determina se as doses precisam ser alteradas. 'Os transplantes foram um grande avanço da medicina. Minimizar as doses dos imunossupressores aos transplantados seria um grande alívio aos pacientes que vivem uma liberdade vigiada', considera Samuel Barbosa Cruz, pai de João. Segundo ele, o filho não pode frequentar ambientes aglomerados e nem tomar sol. 'A pele fica muito sensível. Se ele não usar protetor, corre o risco de ter câncer de pele. Colocamos João em uma escola e em uma semana ele pegou uma infecção. Todo cuidado é pouco', relata.
Ainda assim, os médicos são unânimes: sem os imunossupressores, não seria possível transplantar órgãos. Fernando Bacal, especialista em transplantes cardíacos do Instituto do Coração da Universidade de São Paulo (USP), reforça que são esses medicamentos que debelam a resposta natural do organismo, impedindo a rejeição. O médico lembra que a técnica ficou estagnada entre as décadas de 1970 e 1980, porque os pacientes morriam justamente devido à rejeição.
'A droga tem evoluído também. Hoje, os medicamentos já provocam menos efeitos colaterais que os usados há três décadas', garante. Cada grupo de imunossupressor atua em vias específicas. Os protocolos variam de acordo com o órgão transplantado e a reação imunológica do paciente. 'Os efeitos colaterais mais graves são insuficiência renal e predisposição ao câncer, mas eles podem ser evitados com o ajuste das doses e eventuais modificações dos medicamentos.'
0 comentários:
Postar um comentário