sexta-feira, 14 de maio de 2010

O médium na Umbanda

 Entrevista com Rubens Saraceni, sacerdote umbandista.



Escrito por JUCA   
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JUCA: O estudo teológico da Um­banda e o desenvolvimento mediúnico realizado num dia específico, foram iniciativas suas?

RUBENS SARACENI: Em relação ao desenvolvimento, não acredito que tenha sido pioneiro, logo que abri o Centro, foram surgindo pessoas com mediunidade que precisavam se desenvolver e nos dias de trabalho, o espaço físico mal comportava os médiuns e a assistência, sem contar que nesses dias a carga é muito pesada, então, apenas segui a orientação da espiritualidade para que destinasse um dia apenas para os médiuns em desenvolvimento. Segundo a espirituali­dade, o médium que precisava se desenvolver poderia entrar em contato com uma energia negativa e por falta de conhecimento, teria dificuldade em livrar-se dela. Nos dias reservados ao desenvolvimento, acontecem giras nor­­mais, só não há assistência e nessa oportunidade, os médiuns podem aprender a reconhecer as energias próprias de cada Entidade e de cada Orixá. O estudo teológico de Umbanda sim, é pioneirismo nosso.

JUCA: Como o curso de teologia alertou para a necessidade de os médiuns estudarem?

RUBENS SARA­CENI: Veja bem, cursos e livros sobre a Umbanda existem desde 1930. Naquela épo­ca, os umbandistas acha­ram que esse recurso era necessário para aqueles que queriam praticar a Umban­da e não sabiam como. Agora um curso específico, voltado ape­nas à formação reli­gio­sa da pessoa, inde­pen­­dente de assumir sua mediu­nidade ou não, é atual, pois até então, esse tipo de curso era voltado unicamente para aqueles que praticavam a religião.
Por orientação da espi­ritualidade, nós abrimos esses cursos para todos aqueles que quisessem conhecer a religião da Um­banda, sem implicar na adoção da religião na sua vida. É um curso relativamente curto, que muitos dirigentes já passaram adiante, não apenas para seus médiuns, mas também para a assistência, que passam a adotar a religião não por medo ou temor, mas porque passam a admirar a Umbanda.
O Curso Livre de Teologia de Um­banda é bastante dinâmico, acompanha a evolução da religião e da sua linguagem, adaptado às necessidades das pessoas que o procuram. Eu não criei esse curso, fui apenas o canal utilizado por Pai Benedito de Aruanda, Pai Beira Mar Mestre Seimam e outros espíritos. Fui aquele que batalhou a ferro e fogo a tantas resistências, que hoje já não são tantas, porque o número daqueles que vêem que a religião precisa se adaptar aos novos tempos, na sua apresentação pública, está crescendo. A Umban­da não pode mais ser apresentada co­mo no passado: “Ou você vem por amor, ou vem pela dor”. Por mais que isso possa ser verdade, hoje esse amor é porque o médium aceita a Umbanda como sua religião, e a dor é porque ele é médium e pode ter alguma dificuldade espiritual e a Umbanda pode diminuir essa dor ou até anulá-la a nível espiritual.



JUCA: Então a Umbanda é conhecimento?

RUBENS SARACENI: A Umbanda só vai se fixar no plano material como uma grande religião no dia em que ela usar o conhecimento como um fator para atrair as pessoas. O Budismo atrai as pessoas, não através do Buda, mas através das mensagens do Buda. O Cristianismo não atrai as pessoas pelo Cristo, o homem crucificado, mas pelas mensagens deixadas pelo Cristo. A Umbanda não vai atrair as pessoas pela sua dor, mas pela mensagem regeneradora, curadora, salvacionista, redentora. Principalmente redentora.
A Umbanda tem uma missão redentora que ela ainda não assumiu de público. Todos nós sabemos que existem problemas carmáticos de difícil solução, que são resolvidos através do desenvolvimento da mediunidade, do trabalho desses problemas com o auxílio da espiritualidade, para que esses problemas acontecidos em outras vidas tenham uma solução através do espírito. Isso é a redenção do Ser. A Um­banda tem isso a oferecer, mas ainda não está usando a melhor linguagem para levar isso às pessoas. No dia em que essa linguagem se tornar uniformizada entre todos os umban­distas, a Umbanda se tornará tão atratora, que as outras religiões terão não um adversário, mas um exemplo de como transformar o ser humano, transmutar o íntimo dele, espirituali­zando-o cada vez mais. Os umbandis­tas precisam entender que essa espiri­tualidade que me usou como canal não é estática, mas se transmuta com o passar do tempo. Sua linguagem e conceitos se transmutam, e toda uma forma de abordagem religiosa e pregação doutrinária está sendo formada.

JUCA: Hoje, há um grande número de canais de mídia que tem aumentado a divulgação da Umbanda, e como conseqüência, há também uma maior exposição. Essa exteriorização é positiva?

RUBENS SARACENI: Não é da melhor forma possível que isso está acontecendo. Mas é da forma que ainda é possível. E antes que se torne impossível, nós temos que ocupar esse espaço. Se não fizermos dessa forma, não teremos acesso a meio de comunicação nenhum. Nacionalmente, a Umbanda está excluída dos meios de comunicação. Restaram-nos as iniciativas isoladas de pessoas corajosas, em diversos lo­­cais, levando in­for­­mações aos se­us grupos. Às vezes isso gera curiosidade, e até reações negativas por parte de alguns umbandistas, e até que se gere um canal de comunicação em massa na Umbanda, haverão problemas ainda.

JUCA: A Um­banda vem se tornando mais conhecida, e com isso es­tá se distanciando do candomblé e do espiritismo. Então podemos dizer que ela vem se setori­zando?

RUBENS SARACENI: Está havendo um grande movimento de identificação, que inclusive conta com meu apoio. Grandes líderes candomblecistas vêm se esforçando para dar uma identidade ao candomblé. Embora seja a casa mãe de todos os cultos de nação africana, eles estão lutando para preservar sua identidade. Eu acho isso muito positivo e tenho lutado para dar à Umbanda essa identidade também. A partir do momento que ela se distancia do Candomblé e do Espiritismo, ela assume uma identidade como religião. Não falo em separação, mas em assumir uma identidade pública. Ninguém pode assumir uma identidade dupla. Na lei dos homens, é qualificado como falsidade ideológica. Na religião é como acender uma vela para dois deuses. Apesar de serem três religiões mediú­nicas, são distintas, com doutrinas e ensinamentos específicos.

JUCA: Ainda existe preconceito e intolerância contra a Umbanda?

RUBENS SARACENI: Sim. A Umbanda apesar de ser a religião mais tolerante que existe, é a mais intole­rada. Não apenas por membros de ou­tras religiões, mas pelos próprios um­ban­distas, que não a assumem. Existe uma intolerância latente, que torna comum frases do tipo “umbandista é assim mesmo”... Existem muitas denúncias de intolerância contra os trabalhos umbandistas, algumas culminando até com o fechamento dos templos espirituais. Esses fatos foram se somando e levaram a necessidade de pensarmos numa reação positiva, criando um movimento que congregasse todas as vertentes em torno de propostas que beneficiariam a todos. O maior entrave está sendo a dificuldade de mobilização. Sem um respaldo, como chegar diante do Poder Público com meia dúzia de gatos pingados?

JUCA: Qual seria a solução?

RUBENS SARACENI:
Hoje há um chamado da espiritualidade no sentido de diminuir distâncias entre as lideranças. O lado material da Umbanda precisa mostrar-se coeso. Hoje estão surgindo várias iniciativas neste sentido, e eu entendo isso como um chamado do Astral. Há uma iniciativa por parte do SOUEESP que visa reunir periodicamente essas lideranças para se conseguir maior motivação e mobili­zação dos umbandistas. Toda iniciativa tem um saldo positivo. São sementes que estarão sendo lançadas e as que caírem em solo fértil, prosperarão. Há uma resistência dos próprios umbandistas que vem se tornando cada vez mais evidente. Muitos relutam em tornar isso público. Muitos fazem trabalhos maravilhosos, mas ficam restritos aos seus próprios Centros. Isso precisa ser mudado, eles precisam dar o seu voto de confiança para a religião, expondo-se publicamente, para que se crie a sensação de grandiosidade, que existe, mas está oculta. Os umbandistas ainda não entenderam que as mobilizações são motivadoras para novas adesões. Nós somos muitos, e existe uma maioria silenciosa que está crescendo. Ainda é uma coisa de boca a boca, fica restrito aos fundos dos quintais. Quando o umbandista descobrir o seu poder de mobilização, e ver nesse poder uma forma de valorização da sua religião e da sua religiosidade, aí a Umbanda conquistará o seu espaço público e vai adquirir respeitabilidade. Essa mobilização vai trazer o reconhecimento da Umbanda como religião.
FONTE: Revista Cristã de Espiritismo

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