A edição de número 32 da revista Le Monde Diplomatique (Brasil), de março de 2010, dedicou especial atenção a um tema atual e importantíssimo, que se encontra na agenda de discussões dos governos e sociedades do mundo inteiro – O Futuro das Cidades.
Logo em seu editorial, destaca os grandes desafios que estão colocados para os gestores públicos e privados nestas primeiras décadas do século XXI, tendo como foco maior a redução das desigualdades e a erradicação da pobreza; esta última, entendida como a impossibilidade colocada para as pessoas, que se encontram nesta aviltante condição, de decidir sobre sua própria vida. Assim sendo, os desafios elencados preliminarmente seriam os seguintes:
· Colocar o bem estar da coletividade acima de quaisquer outros interesses;
· Cobrar a transparência da gestão pública e garantir mecanismos de controle, públicos e sociais, sobre essa gestão;
· Elaborar particitivamente um projeto de erradicação da pobreza para garantir direitos sociais básicos a todos os cidadãos, com enfoque na dinamização dos circuitos curtos de economia, garantia de trabalho, novos paradigmas de produção e consumo, redução drástica da poluição ambiental, reconversão das matrizes energéticas e preservação do meio ambiente.
Trazendo todas estas preocupações para a esfera da nossa mais perfeita e próxima tradução, talvez o caso de vida ou de morte do enfrentamento seja o próprio presente da nossa cidade, que completará em 2012, 400 anos de existência, apesar de algumas legítimas controvérsias dos historiadores acerca do marco fundante da nossa capital patrimônio da humanidade.
O que tenho acompanhado pela imprensa, pelos contatos e algumas intenções e gestos que até agora foram explicitados publicamente, só faz crescer assustadoramente minhas apreensões e, com toda certeza, as de milhares de outras pessoas que nasceram ou que optaram por habitar este encantado pedaço de Brasil.
A questão do planejamento urbano de São Luís, sob todos os aspectos, é muito grave! Diria mais: gravíssima! As soluções e propostas para as celebrações dos 400 anos se reduzem a investimentos em comemorações festivas, que podem acabar se reduzindo a uma guerra política sem precedentes em torno da disputa eleitoral pela sucessão municipal, pura e simplesmente. Projetos mirabolantes de construção de pontes para dar passagem a um maior número de automóveis e patrocínio do enredo de 2012 da Escola de Samba Beija-Flor, do Rio de Janeiro, são dois visíveis exemplos do que falo.
São Luís, de há muito, enfrenta um esgotamento que nem poderíamos qualificar de aplicação de políticas públicas, porém justamente da ausência destas, em quase todas as áreas. As feridas políticas e sociais são tão imensas que os esparadrapos aplicados no dia a dia para escondê-las só colaboram com a exposição da nudez de um organismo municipal enfermo e acometido pela mais grave das moléstias administrativas: a irresponsabilidade e o descaso com a sua própria população, proporcionados, simultaneamente, por todas as esferas de governo – municipal, estadual e federal -, personificadas nas pessoas dos seus representantes maiores: João Castelo, Roseana Sarney e Dilma Roussef.
É notório e sabido que dentro de muito pouco tempo o tráfego da cidade travará literalmente. A mobilidade urbana se tornará impraticável, atravancada pela buraqueira insuportável e pelo volume de veículos de uso individual ampliado diariamente sem a mínima solução de escoamento. Até o presente momento desconheço qualquer proposta de governo, nas três esferas administrativas, que vá de encontro à superação definitiva do predomínio do automóvel individual na matriz dos transportes de massa para modalidades integradas e sustentáveis, baseadas em veículos de uso coletivo movidos a fontes de energia limpas e renováveis.
Cidade sem parques públicos, sem locais decentes e adequados para as práticas de lazer, cultura, esportes ou entretenimento para suas crianças, para sua juventude, para os adultos e idosos é uma cidade desencantada e sem alma. É uma cidade refém dos tubarões da especulação imobiliária mais incontrolável que já aconteceu por estas paragens nos últimos tempos e dos ditames das empresas de transportes coletivos, sem nenhum compromisso com o desenvolvimento humano.
A situação política, econômica e sócio-cultural de São Luís e do Maranhão é simplesmente vergonhosa; e mais vergonhoso ainda é o nosso silêncio e a nossa omissão. É muito triste o destino dado ao andamento das obras do projeto do PAC do Rio Anil, que no seu bojo previa a construção de uma importante avenida para o escoamento do tráfego da cidade e condições de moradia digna para milhares de pessoas, além da disponibilidade de equipamentos esportivos, de lazer e de cultura.
O ponto a que chegamos não comporta mais soluções sem contrariedades de interesses, sem dores ou ranger de dentes. Em muitos casos, terão de ser realizadas cirurgias urbanas sem anestesia. Não há mais como se permitir a circulação de veículos de grande porte no centro da cidade, o uso dos espaços públicos sem nenhum disciplinamento e os estacionamentos atuais, agredindo as regras mais elementares de convivência urbana. Em relação ao patrimônio histórico edificado, a única solução que ainda resta é a desapropriação prevista em lei, mais precisamente no Estatuto das Cidades. A coragem e o tutano para aplicá-la são outros quatrocentos.
Joãozinho Ribeiro
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