Prof. João Batista Ericeira
As grandes empresas propugnam por um
Judiciário célere, de acordo com os seus interesses econômicos, que lhes
dê certeza e previsibilidade negocial, preservando o Direito de
propriedade. Os cidadãos, de igual modo, organizam-se individual e
coletivamente para pleitear o que lhes é concedido pela legislação,
embora na prática social ocorra o oposto da previsão normativa. As duas
situações deparam-se com padrões de organização burocrática do
Judiciário e metodologias de solução dos conflitos defasadas, e,
portanto ineficientes em relação ao volume de demandas, daí, as criticas
sobre a lentidão ao aparelho judicial e de sua incapacidade de
responder à tarefa de distribuição da Justiça, essencial para a crença
no papel do Direito na construção da sociedade democrática.
As queixas acumulam-se,
sobretudo no combate a corrupção, onde se diz que juízes e tribunais não
julgam os poderosos, detentores de imunidades e prerrogativas, que os
fazem infensos à ação das leis, que só atingem pela repressão as pessoas
oriundas das classes populares. Mas os juízes e tribunais não são
responsáveis pelo ordenamento jurídico que mantém a igualdade apenas no
plano formal. O Legislativo carece de democratizar-se, de adotar
práticas que permitam a participação da sociedade, tornando efetivas as
consultas à população através da internet, para tanto, requer-se vontade
porque os recursos tecnológicos são disponíveis.
Fora disso, diante da crise de
representatividade de parlamentos e partidos, não há que se falar de
reforma política, sem participação da cidadania, ela não passará de mais
um remendo legislativo condenado à ineficácia. A tendência mundial
nessa direção é evidente. Aí estão as primaveras árabes, as praças da
Espanha, da Itália, da Grécia. O movimento espalha-se pelos continentes e
já chegou a América do Sul, mais precisamente ao Chile.
País da nossa admiração, por
suas tradições culturais, intensa vida universitária, inconfundíveis
vinhos, belíssimas paisagens, como se não bastasse, berço de dois
monumentos da poesia universal, Gabriela Mistral e Pablo Neruda, ambos
agraciados para o orgulho latino-americano com o Prêmio Nobel de
Literatura. A economia chilena cresce a ritmo acelerado, a previsão para
o corente anos é de 6%, a repetição do exercício anterior. Mas a metade
da população encontra-se excluída dos resultados do crescimento
econômico. 20% da população dispõem de padrão de renda igual ao da
Noruega e Dinamarca, enquanto 60% têm renda média inferior a Angola. Os
resultados políticos são notórios, na última eleição presidencial dos
doze milhões de eleitores apenas 7 milhões inscreveram-se. No Brasil,
não fora o voto obrigatório, teríamos semelhante resultado. As
manifestações de rua lideradas pela presidente da Federação Estudantil,
Camilla Vallejo, se sucedem, a última do dia 14, reuniu em Santiago 150
mil pessoas, com uma pauta de reivindicações exigindo melhorias no
sistema educacional, nas condições de trabalho, no campo e na cidade, na
defesa ambiental, e como não poderia deixar de ser, combatendo a
inépcia da classe política, fechada sobre si mesma, cuidando de
locupletar-se, enfim, exigindo parâmetros éticos na condução da
administração pública.
Camilla, a bela moça de 23 anos,
que lidera na tarde de Santiago as manifestações de rua, vocaliza as
aspirações de milhares de chilenos e de latino-americanos, pela
transparência nas relações entre os poderes públicos, Legislativo,
Executivo, Judiciário e a sociedade, e acima de tudo, pela maior
participação desta última na condução do Estado, como indispensáveis à
formação de uma cultura política e jurídica verdadeiramente democrática.
jbericeira@veloxmail.com.br
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