sábado, 3 de setembro de 2011

A BELA DA TARDE

Prof. João Batista Ericeira

Prof. João Batista Ericeira
Advogado, professor universitário, diretor da EFG-MA, membro do Conselho Consultivo da Escola Nacional de Advocacia (ENA/OAB)
As grandes empresas propugnam por um Judiciário célere, de acordo com os seus interesses econômicos, que lhes dê certeza e previsibilidade negocial, preservando o Direito de propriedade. Os cidadãos, de igual modo, organizam-se individual e coletivamente para pleitear o que lhes é concedido pela legislação, embora na prática social ocorra o oposto da previsão normativa. As duas situações deparam-se com padrões de organização burocrática do Judiciário e metodologias de solução dos conflitos defasadas, e, portanto ineficientes em relação ao volume de demandas, daí, as criticas sobre a lentidão ao aparelho judicial e de sua incapacidade de responder à tarefa de distribuição da Justiça, essencial para a crença no papel do Direito na construção da sociedade democrática.

As queixas acumulam-se, sobretudo no combate a corrupção, onde se diz que juízes e tribunais não julgam os poderosos, detentores de imunidades e prerrogativas, que os fazem infensos à ação das leis, que só atingem pela repressão as pessoas oriundas das classes populares. Mas os juízes e tribunais não são responsáveis pelo ordenamento jurídico que mantém a igualdade apenas no plano formal. O Legislativo carece de democratizar-se, de adotar práticas que permitam a participação da sociedade, tornando efetivas as consultas à população através da internet, para tanto, requer-se vontade porque os recursos tecnológicos são disponíveis.

Fora disso, diante da crise de representatividade de parlamentos e partidos, não há que se falar de reforma política, sem participação da cidadania, ela não passará de mais um remendo legislativo condenado à ineficácia. A tendência mundial nessa direção é evidente. Aí estão as primaveras árabes, as praças da Espanha, da Itália, da Grécia. O movimento espalha-se pelos continentes e já chegou a América do Sul, mais precisamente ao Chile.
País da nossa admiração, por suas tradições culturais, intensa vida universitária, inconfundíveis vinhos, belíssimas paisagens, como se não bastasse, berço de dois monumentos da poesia universal, Gabriela Mistral e Pablo Neruda, ambos agraciados para o orgulho latino-americano com o Prêmio Nobel de Literatura. A economia chilena cresce a ritmo acelerado, a previsão para o corente anos é de 6%, a repetição do exercício anterior. Mas a metade da população encontra-se excluída dos resultados do crescimento econômico. 20% da população dispõem de padrão de renda igual ao da Noruega e Dinamarca, enquanto 60% têm renda média inferior a Angola. Os resultados políticos são notórios, na última eleição presidencial dos doze milhões de eleitores apenas 7 milhões inscreveram-se. No Brasil, não fora o voto obrigatório, teríamos semelhante resultado. As manifestações de rua lideradas pela presidente da Federação Estudantil, Camilla Vallejo, se sucedem, a última do dia 14, reuniu em Santiago 150 mil pessoas, com uma pauta de reivindicações exigindo melhorias no sistema educacional, nas condições de trabalho, no campo e na cidade, na defesa ambiental, e como não poderia deixar de ser, combatendo a inépcia da classe política, fechada sobre si mesma, cuidando de locupletar-se, enfim, exigindo parâmetros éticos na condução da administração pública.

Camilla, a bela moça de 23 anos, que lidera na tarde de Santiago as manifestações de rua, vocaliza as aspirações de milhares de chilenos e de latino-americanos, pela transparência nas relações entre os poderes públicos, Legislativo, Executivo, Judiciário e a sociedade, e acima de tudo, pela maior participação desta última na condução do Estado, como indispensáveis à formação de uma cultura política e jurídica verdadeiramente democrática.

jbericeira@veloxmail.com.br
 

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