sábado, 3 de setembro de 2011

REAÇÃO À CORRUPÇÃO

Prof. João Batista Ericeira
Dia 11 do mês corrente, o Jornal “O Globo”, do Rio de janeiro, reproduziu texto de autoria do jornalista Juan Arias intitulado: “Por que os brasileiros não reagem?”. Nele, o articulista espanhol indaga se o os brasileiros perderam a capacidade de indignação diante dos sucessivos escândalos ali listados. O artigo reproduzido em periódicos de grande circulação gerou debates em emissoras de televisão. O canal de assinatura Globo News, dedicou sábado passado um programa “Painel” especial sobre o controvertido assunto dos limites da corrupção na esfera pública, e a sensibilidade ética da nossa sociedade diante dos reiterados e contumazes desvios de personalidades da política nacional.

No programa da Globo News, o professor Marco Antônio Villa, da Universidade de São Carlos, desancou a centenária República brasileira, como consolidadora do padrão de corrupção que se espalha por todos os poderes do Estado, mas responsabiliza particularmente o Judiciário pela impunidade, e convoca a nação a uma cruzada contra a corrupção pela ética pública. Mais adiante será abordada a tormentosa questão da partilha de responsabilidade entre os poderes republicanos e a forma de cobrá-la. Fica em aberto o questionamento crucial: o Brasil é um país republicano?

Já que tudo começou com o texto de Arias, correspondente de “El País”, o principal periódico da Espanha, não custa lembrar que a corrupção brasileira é em parte originária da cultura ibérica que o periodista conhece muito bem, a partir da indistinção entre o patrimônio privado e o público, este último pertencente ao Rei da Espanha e de Portugal que o dividia entre parentes e apaniguados. A colonização luso-espanhola transplantou para os trópicos o Estado patrimonialista, inteiramente incompatível com a República e os seus correspondentes vícios, dentre eles, o locupletamento da coisa pública e o caudilhismo, à busca sempre de homens providenciais, ao largo das ideologias e dos partidos políticos.

O jornal “El País” tem dedicado espaço aos triunfos da economia brasileira, apresentando-a como emergente e triunfante, embora faça ressalvas ao péssimo quadro de distribuição de renda e desigualdade social. Ano passado, poucos meses antes das eleições presidenciais, realizou entrevista com o ex-presidente Lula, definindo-o como “multi-ideológico”, destacando que nas relações com a Espanha, o chefe de Estado brasileiro dera-se bem com o direitista primeiro-ministro José Maria Aznar, de modo igual com o socialista José Luiz Rodriguez Zapatero. Mas qual e diferença entre um e outro? Ambos representavam a Espanha, e afinal tratava-se de relações institucionais. Mas é fato, na prática deste mundo financeirizado, chegado ao poder em termos de políticas públicas, não diferenças entre o conservador e o esquerdista. Não se esquecendo de sublinhar que ambos os governos foram pontilhados de escândalos de corrupção.

Herança cultural à parte, a crise da corrupção não açoita apenas aos ibéricos, que o digam os ingleses, alemães, americanos, franceses, chineses, japoneses. O mundo dominado pelo poder do dinheiro e dos bancos encontra-se mergulhado em profunda crise ética. O Estado encontra-se apropriado por interesses privados. No Brasil, na Espanha e no mundo, urge que se refaça o pacto político e se remodele as instituições, incluindo a representação política. A Islândia começar a dar o exemplo está reescrevendo a Constituição com a participação da população através da internet.

O Judiciário, apresentado pelo historiador Marco Antonio Villa, como o principal legatário da herança colonial ibérica, não é melhor nem pior que os dois outros poderes, As leis é que precisam ser feitas pelo povo, em benefício do povo. Afinal, não custa nada sonhar, pois é uma das boas heranças da nossa cultura, como bem desenhou San Thiagp Dantas em “Dom Quixote- um apólogo da alma ocidental”.

O mesmo San Thiago, cujo centenário de nascimento agora comemoramos, era a esse propósito profético: a reação à corrupção virá do povo, que no caso brasileiro, é bem melhor que a sua elite.

jbericeira@veloxmail.com.br

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