O aroma robusto do café paira no ar, penetrando as ruelas de paralelepípedos e os boulevares movimentados. De Paris aos recantos mais modestos do Brasil, os cafés se tornam guardiões de histórias arquitetadas pelos fios invisíveis do destino. São palcos onde as vidas se desenrolam, onde as palavras fluem tão livremente quanto o vapor que sobe das xícaras.
Em Paris, a cidade do amor e da boemia, os cafés são mais do que meros estabelecimentos; são lendas vivas. Sob as sombras das icônicas mesas externas, poetas como Hemingway e escritores como Simone de Beauvoir deixaram suas pegadas literárias. Os cafés parisienses, com suas cadeiras de vime gastas pelo tempo, testemunharam a dança do amor em muitas línguas, nas palavras sussurradas e nos olhares que se encontram como páginas de um romance.
Mas não é apenas nas avenidas iluminadas por luzes de rua que encontramos essa mágica. Nas calçadas desgastadas de cafés anônimos em pequenas cidades brasileiras, a magia está presente de maneira mais sutil, mas igualmente envolvente. É assim o café da Raquel, mulher, forte e lutadora, que vender seu café com bolo de Tapioca de Caroço, Beiju e o Cuscuz de Arroz, guloseima matinal da culinária maranhanse, mas no final de semana o reggae é a Lei.
As histórias que se desenrolam entre essas paredes muitas vezes escapam dos registros históricos, mas são igualmente dignas de nota.
No café de Raquel, situado em uma esquina esquecida, entre as ruas Clores Miranda e 28 de Julho, na terra da Bacaba, presenciei o delicado encontro de dois amantes que, nas palavras trocadas ao sabor do café, tornaram-se cúmplices de um capítulo romântico que escaparia dos livros. Era como se o bule borbulhasse com o doce perfume do destino. Vi Dr Bento Vieira fazer uma análise da conjuntura politica local e ouvir a Resenha sobre a ultima noite de Reggai de Raquel.
Os cafés, em sua natureza acolhedora, tornam-se refúgios para a introspecção. Sob a luz suave de lâmpadas penduradas, os clientes se perdem em pensamentos, enquanto as páginas de um livro viram a cadência da vida que passa. A solidão, longe de ser uma mera ausência, transforma-se em companhia silenciosa entre as paredes enfeitadas de fotos antigas e quadros desbotados.
E que dizer da relação intrínseca entre cafés e a arte da escrita? Poetas traçam versos nas páginas dos guardanapos enquanto a tinta da caneta flui mais intensamente do que a cafeína nas veias. Escritores, curvados sobre seus cadernos, desvendam enredos em meio ao burburinho e ao tilintar das xícaras. Quantas músicas e percussões Papete, Joãozinho Ribeiro, Zé Lopes e João do Vale devem terem criados embriagados pelo cheiro dos cafés.
As conversas nos cafés são um espetáculo próprio, uma sinfonia de vozes que narram o cotidiano. Na mesa ao lado, um grupo de amigos risca o papel com canetas coloridas, criando mapas imaginários para aventuras futuras. No balcão, dois estranhos compartilham risos e histórias como se fossem velhos conhecidos.
Cada café, do mais grandioso ao mais humilde, se torna um capítulo nas narrativas pessoais daqueles que o visitam. São espaços que transcenderam sua função original de simples locais para tomar café, transformando-se em testemunhas silenciosas de vidas que se entrelaçam e se desenlaçam como os grãos moídos que dão vida à bebida escura.
Assim, entre cafés de Paris e os cantos escondidos do Brasil, somos todos personagens dessa crônica interminável, onde o aroma do café se mistura com as histórias que contamos e as que ainda estão por vir. E, enquanto a última gota é sorvida, o próximo capítulo se desenha, pronto para ser escrito nas páginas amareladas da vida
Professor, Jornalista e Escritor membro da
Academia Bacabalense de Letras
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