domingo, 17 de abril de 2011

Documentos indicam que a ditadura via nos estudantes uma ameaça

O governo temia perder o controle dos movimentos estudantis depois da invasão da Universidade de Brasília (UnB) por policiais, em 29 de agosto de 1968. Na ocasião, agentes dos órgãos de repressão pretendiam prender os líderes que protestavam no local. Os estudantes resistiram e houve confronto até que os universitários terminassem rendidos e detidos. Documentos da época divulgados agora mostram que o regime enxergava força de contestação nos estudantes e recomendava combater com “todas as armas” o que chamava de inimigo, que estaria provocando ações de “guerra psicológica”. A partir do episódio, a UnB passou a ser um dos principais alvos dos órgãos de informações da ditadura.

A cronologia da invasão é relatada em documento confidencial do gabinete do Ministério da Aeronáutica datado de 4 de setembro de 1968, uma semana depois do confronto no câmpus. “A UnB vem vivendo momentos de grande agitação e balbúrdias até por decorrência da falta de solução a diversos problemas, alguns surgidos no decurso da atual administração”, observou o analista da Aeronáutica, em referência à gestão do médico mineiro Caio Benjamin Dias na reitoria, definida pelos militares como “duas faces”: uma para os estudantes, outra para o governo.

No relatório de 12 páginas, que integra o acervo do Centro de Informações da Aeronáutica (Cisa), aberto na semana passada pelo Arquivo Nacional, os militares avaliam que os universitários pretendiam tornar a instituição “um território sagrado”. Isso, conforme o relatório, tinha como finalidade trazer para as cidades o que era feito pela esquerda na zona rural: “A criação de áreas livres ou liberadas para a montagem de bases de operações. (…) A transferência do trabalho das esquerdas dos operários para o meio estudantil está perfeitamente caracterizada por grande número de panfletos distribuídos aberta e acintosamente”, relata o documento, que faz referência específica à Federação dos Estudantes da UnB (Feub), presidida por Honestino Guimarães. O líder estudantil é definido no texto como “agitador decidido, que tem encontrado encorajamento na cobertura que alguns deputados da oposição lhe têm dado”. Honestino acabaria preso e morto nos porões da ditadura em 1973.
Inimigo
Na conclusão, o analista avalia que, até aquele momento, início de setembro de 1968, o governo não havia solucionado a questão. “Traduzido em uma série de medidas tomadas, não surtiram os efeitos almejados, como se vê na situação atual, em que se configuram nitidamente ações de guerra revolucionária em pleno curso.”

O analista reconhece que “muito terreno já foi perdido” e ressalta que seria necessário usar todos os meios na contraofensiva. “Caso o inimigo não seja combatido com todas as armas, a todo momento, por todos os meios e em qualquer terreno, as posições que já conquistou ficarão fortalecidas. E, assim, mais livre lhe ficará o caminho para a conquista de seu objetivo: a queda do regime”, conclui. No acervo do Cisa há centenas de informes relatando reuniões de alunos ou professores e até espionagem de discussão sobre o preço do bandejão. 

FONTE: O Imparcial

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