terça-feira, 19 de março de 2013

Brasileiros ajudaram a desenvolver olho biônico


CLÁUDIA COLLUCCI
Pesquisadores brasileiros ajudaram a criar o primeiro olho biônico, aprovado no mês passado nos EUA, e agora colaboram em outro projeto que usa células-tronco da retina para recuperar a visão. A revelação é do inventor do olho biônico, o engenheiro biomédico Mark Humayun, 50, que mantém uma parceria de 15 anos com o departamento de oftalmologia da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo).
Em entrevista, o professor da Universidade do Sul da Califórnia afirma que seu maior desafio tem sido administrar a expectativa das pessoas sobre a nova tecnologia. 'Não podemos alimentar falsas esperanças'
O olho biônico Argus II não restaura completamente a visão, mas permite que pessoas com uma doença rara que leva à cegueira (retinose pigmentar) detecte faixas de pedestres, presença de pessoas e grandes números e letras. Ao menos 60 pessoas na Europa e nos EUA já usam o aparelho, a maioria subsidiada por programas governamentais. A tecnologia aguarda registro da Anvisa para ser comercializada no Brasil. Espécie de Professor Pardal, Humayun tem cem patentes registradas em seu nome, entre elas bombas de insulina para diabéticos e dispositivos cerebrais.

ENTREVISTA:
O que o inspirou na criação do olho biônico?
Mark Humayun - Minha avó ficou cega por complicações da diabetes e, naquela época, pensei que poderia fazer algo para ajudá-la.
Quando foi isso e quais obstáculos o sr. enfrentou?
Há 25 anos, quando começamos com essa ideia, colocar um computador dentro dos olhos era ficção científica. Nos primeiros anos, havia pouco dinheiro, pouco apoio.
Para mudar isso, passamos a colocar o aparelho por 30, 45 minutos nos olhos de cegos, com anestesia local, e perguntar o que eles estavam vendo. O fato é que puderam ver um eletrodo dentro do olho e, então, acreditamos que poderíamos construir uma retina artificial.
O olho biônico custa US$ 100 mil. O sr. acredita que, com o tempo, ficará mais acessível?
O aparelho possibilita a visão por ao menos dez anos. São US$ 10 mil por ano. Por esse prisma, não é tão caro. Mas acredito que, com melhores técnicas de fabricação, poderemos torná-lo mais barato. Temos que lembrar que foram investidos US$ 200 milhões para desenvolvê-lo. Então, US$ 10 mil dólares por mês não é muito.
O aparelho não restaura completamente a visão. Ele deve ser aprimorado?
Ele permite identificar objetos grandes, como portas, contorno de corpos. Isso é uma grande coisa. Mas os usuários não podem reconhecer um rosto ou ler como nós lemos. A tecnologia deve melhorar cada vez mais.
Ele poderá ser usado em pessoas com outras doenças, como a degeneração macular?
Não temos essa resposta. Teoricamente, só precisamos melhorar a tecnologia.
Em quanto tempo?
O primeiro modelo do aparelho levou 15 anos para ser desenvolvido. O segundo, sete. Estamos aprendendo rápido e, em três ou quatro anos, teremos um novo modelo.
Qual o principal desafio ainda a ser enfrentado?
Administrar a expectativa das pessoas. Todo mundo ouviu sobre o olho biônico e todo mundo quer. Precisamos ser muito claros sobre o perfil de pessoas que serão beneficiadas com ele. Não podemos alimentar falsas esperanças. Ele não pode ser usado em doenças em que o nervo óptico foi lesionado ou em condições em que não há mais células viáveis da retina.
O Brasil teve participação neste projeto?
O Brasil tem um grande papel na pesquisa. Tenho recebido pesquisadores brasileiros no meu laboratório nos EUA, e eles contribuíram muito desde o início.
O sr. desenvolve outra pesquisa, em parceria com a Unifesp, que envolve uso de células-tronco. Do que se trata?
O olho biônico tenta restaurar a visão perdida, já as pesquisas com célula-tronco pretendem recuperar a retina que está morrendo.
São células-tronco que se diferenciam in vitro em células do epitélio pigmentar e são colocadas numa membrana. A hipótese é que colocar essas células debaixo da retina vai dar a nutrição para as outras células se manterem ou melhorarem.
Estamos na fase pré-clínica. Os primeiros pacientes precisam ser aprovados pelo FDA. Isso deve acontecer em 2014.
VISÃO HIGHT-TECH
Aparelho ajuda quem tem retinite pigmentosa que afeta 1 em 4000
1 - CAPTURAR
Uma minicâmera de vídeo nos óculos capta a cena e a envia a um computador usado pelo paciente a tiracolo.
2 - ENVIO
O sinal é processado e volta aos óculos, de onde é transmitido sem fio ao implante colocado na retina por cirurgia.
3 - ESTÍMULOS
A informação visual vai para os microeletrodos na retina, onde vira pulsos elétricos que driblam os fotoreceptores danificados do paciente e estimulam as células remanescente na retina. Os dados visuais percorrem o nervo óptico até o cérebro.
4 - APRENDIZADO
Os padrões de luz chegam ao cérebro do paciente, que aprende a interpretá-los como objetos do dia-a-dia.

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