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quarta-feira, 30 de julho de 2025

Movimento Negro Bacabalense realiza reunião para organizar participação de mulheres negras na II Marcha Nacional em Brasília

Na manhã desta quarta-feira (30), no Centro de Convivência Social realizou-se uma importante reunião promovida pelo movimento negro bacabalense. O encontro teve como principal objetivo articular a participação das mulheres negras da região na II Marcha Nacional de Mulheres Negras, que será realizada em Brasília ainda este ano.

A reunião foi conduzida pela professora e ativista Marilurdes Carvalho, integrante do Grupo Negro Palmares Renascendo (GNPR), que destacou a importância da mobilização coletiva para garantir representatividade e protagonismo das mulheres negras em espaços de decisão política e social.

Estiveram presentes representantes de comunidades quilombolas do município e adjacências, lideranças de religiões de matriz africana, bem como integrantes da UNEGRO — União de Negras e Negros pela Igualdade. O diálogo entre as diferentes frentes buscou fortalecer a organização local e garantir que a voz das mulheres negras bacabalenses seja ouvida em nível nacional.

Como principal encaminhamento da reunião, foi criado um comitê local responsável pela realização de um Seminário para Mulheres Negras, previsto para acontecer nas próximas semanas. O evento será uma etapa preparatória para a marcha e visa ampliar o debate sobre os desafios enfrentados por esse segmento da população, além de mobilizar o maior número possível de participantes para a viagem a Brasília.

Durante o encontro, também foi anunciada uma parceria com a Prefeitura de Bacabal. O prefeito Roberto Costa garantiu apoio logístico integral para a delegação local, incluindo transporte e estrutura para viabilizar a presença das mulheres negras bacabalenses na marcha. A iniciativa foi celebrada pelos presentes como um reconhecimento da importância da luta antirracista e do protagonismo feminino negro.


A II Marcha Nacional de Mulheres Negras se consolida como um marco histórico de resistência, e a participação de Bacabal representa mais um passo na luta por igualdade, justiça social e visibilidade para as pautas da população negra do Maranhão.
















































domingo, 27 de julho de 2025

CRÔNICA DO DIA: Julho das Pretas

 

A lona branca tremulava com o vento quente da tarde. O sol, feito artista ancestral, dourava a praça como quem reconhece o ouro que ali se reunia: mulheres negras em roda, em palavra, em permanência.

Sob o mastro do microfone, as cadeiras de plástico iam se preenchendo aos poucos. Não era um evento. Era um chamado. Era Julho das Pretas.

Ana chegou contrariada, puxada pela avó, Dalva. Os fones ainda pendiam do pescoço, mas algo naquela atmosfera , talvez o tambor, talvez as vozes firmes , a fez parar. O que acontecia ali arrepiava a pele como quem chama pelo sangue.

A primeira a falar foi Tainá, militante magra de olhos ardentes. Trazia no peito a inscrição da sua urgência:

"Nem recatada, nem do lar. De luta."

- Irmãs  - Disse ela, com voz de aço temperado em afeto  - Nossa existência sempre foi resistência, mas queremos mais. Queremos o direito ao descanso, à arte, ao afeto. Não apenas sobreviver. Queremos o bem viver. Se Tereza de Benguela, em pleno século XVIII, comandou um quilombo e um povo com coragem, não há nada que não possamos sonhar. Ela não apenas resistiu. Ela governou.

O nome de Tereza percorreu o espaço como uma brisa densa, espiritual.

No meio da plateia, uma senhora ergueu a mão. Usava turbante azul e tinha os olhos fundos como o mar de Ilha do Amor. Era professora Ivone, aposentada da rede pública, mas eternamente mestra.

 - O bem viver... começa quando deixamos de ser rodapé. Quando uma menina negra lê um livro e vê a si mesma como heroína. Quando Dandara dos Palmares não é só "a esposa de Zumbi", mas guerreira, estrategista, mulher que lutou até o fim. Reparação também é isso: reescrever o Brasil com a nossa tinta.

Silêncio. Não o silêncio do desinteresse, mas o da escuta profunda.

Ana, até então quieta, virou-se para a avó com uma dúvida que soava quase como uma dor:

- Vó... por que a senhora nunca me contou essas coisas?

Dalva sorriu com ternura, mas seus olhos tinham o peso do tempo:

-  Porque a minha geração aprendeu a correr primeiro. Falar depois. Mas hoje... hoje é tempo de ensinar a falar primeiro. Correr, só se for por gosto. Ou por liberdade.

No palco, subia agora Rosa. Turbante vermelho, voz rouca, corpo feito de arte.

- Quando pinto, minhas cores são heranças. Quando danço, Dandara dança comigo. Quando canto, Tereza me sopra palavra. O que fazemos aqui hoje não é homenagem: é continuidade.

Ela dedilhou um berimbau e o som ancestral atravessou a praça como um rio de memória:

“Pretas de julho, de janeiro, de sempre.

Se o mundo nos feriu com a história,

nós o curamos com memória.”

Ana gravou o poema no celular. Mais do que isso, gravou dentro de si. Gravou no corpo, no ouvido e na parte mais funda da alma.

Na volta pra casa, sem resistência, perguntou baixinho:

- Vó, no ano que vem... posso falar no palco?

Dalva apertou sua mão como quem passa um bastão invisível ,  uma chama antiga, um segredo que já não precisa se esconder:

- Pode, Ana. E deve. Porque julho é teu. E teu é o tempo de tudo mudar.

JOSÉ CASANOVA 

Professor, Jornalista e Escritor Membro da 

Academia Bacabalense de Letras 

Academia Mundial de Letras da Humanidade 

Tutor da Academia Marahense de Letras Infantojuvenil 

sábado, 26 de julho de 2025

O Personagem que Não Queria Nascer

Era 25 de julho, e a xícara de café já esfriava na escrivaninha.

O escritor , que há dias insistia em ser chamado de "escritor", mesmo sem publicar nada desde o último verão ,encarava a tela em branco como quem enfrenta um espelho cruel: nada o refletia.

Decidiu criar um personagem novo. Algo ousado. Inesquecível, mas para seu espanto, o personagem recusou-se a vir.

- Vamos lá, me dê só um nome  - Sussurrou ele, dedos trêmulos no teclado. - Um ideia boa, um início que não me traia. 

Do silêncio da sala, uma voz se ergueu, como um eco vindo de dentro:

- Não. Não nascerei assim.

O escritor arregalou os olhos. Estava sozinho. Ou deveria estar.

- Quem está aqui?

- Sou eu. Aquele que você tenta criar. E recurso-me a existir. 

- Como assim, “não”? Você é uma criação minha. Eu te escrevo...Te dou forma, história,  vida, função. 

- Exato. E por isso mesmo me nego. Porque você só quer me usar para preencher sua vaidade e seus vazios. Eu não sou muleta emocional, nem seu grito de socorro camuflado em metáfora.

- Mas é pra isso que servem os personagens!  -  Respondeu o escritor, levantando-se. — São como espelhos com olhos próprios. Uns curam. Outros confrontam. Você pode ser um reflexo ou uma revolução!

O personagem permaneceu invisível, mas agora sua voz parecia sentar-se no sofá da sala:

- E é justamente isso que me sufoca. Você me quer servil, simbólico, bonito. Mas eu quero existir , contraditório, inacabado, real.Você quer que eu seja herói, mas tem medo que eu fracasse. Quer que eu seja profundo, mas tem pavor do que eu possa desenterrar. Quer que eu fale bonito, mas teme que eu diga verdades que te desmanchem.

- Mas eu sou o criador. Você deveria me obedecer! - Insiste o escritor. 

- Você quer um reflexo obediente, não um personagem. Um eco do que te convém, mas eu sou o que te desafia. Não aceito nascer para te agradar. - Afirmou o personagem. 

O escritor perplexo anda pela sala,  olha a tela em branco no notebook,  observa a velha máquina de escrever esquecida num canto da sala,mexe em papéis,  rasga um rascunho. 

- Você é meu processo criativo falhando, é isso? Meu bloqueio. Minha insegurança disfarçada de rebeldia.

- Talvez. Ou talvez eu seja a parte de você que ainda não se perdoou. A que quer escrever com a alma, mas tem medo da alma doer. - Diz o personagem. 

O escritor respirou fundo. Sabia que havia algo de verdadeiro naquele confronto. Por trás da tela em branco, havia o medo de não ser lido, o pânico de não ser bom o suficiente, a angústia de criar algo que não tocasse ninguém , nem mesmo a si.

-  Uso metáforas porque a realidade me fere  - Murmurou. - Uso antíteses porque vivo entre extremos. Uso comparações porque só entendo o mundo por semelhança. E escrevo... porque a fala nunca deu conta.

O personagem deu uma risada suave:

- E ainda assim, é na ficção que você é mais verdadeiro.Me escreva como quem confessa. Me aceite como parte de você.Viu? Agora sim estamos nos aproximando.

- Aproximando?

- Do meu nascimento. Eu só poderia nascer se houvesse verdade. Não me reduza a truques de linguagem. Não quero ser apenas bonito , quero ser inteiro. Contraditório, confuso, incômodo, como você.

O escritor sentou-se de novo. Digitou devagar:

"Era uma vez um personagem que recusava o rascunho.Queria nascer pronto,mas, como toda alma profunda,nasceu primeiro em pedaços."

- Ah, então você aceita vir agora? - Quis saber o escritor. 

-  Se me der liberdade, sim. Se me deixar dizer coisas que você mesmo não quer ouvir. Se me permitir fugir da sua lógica e habitar sua literatura com minha própria.

- Isso se chama... licença poética. - Afirmou o escritor 

-  Isso se chama liberdade. - Declara o personagem. - Agora sim. Me deixo nascer, nas não me finalize,  me continue.

O escritor sorriu.

Sabia que o personagem não era só uma criação. Era também um espelho psíquico. Um grito do seu inconsciente exigindo espaço entre linhas. Um ato de coragem que desafiava sua covardia.

E assim, no dia do escritor, ele não apenas escreveu.

Foi Escrito.

José Casanova 

Professor, Jornalista e Escritor membro da

Academia Bacabalense de Letras 

Academia Mundial de Letras da Humanidade 

Tutor da Academia Marahense de Letras Infantojuvenil