terça-feira, 21 de janeiro de 2025

CRÔNICA DO DIA: De Teresina a São Luís: Uma Viagem, Um Canto

 

Na cadência compassada dos trilhos, a viagem de Teresina a São Luís transforma-se em mais que um simples deslocamento: é uma epopeia nordestina, um poema em movimento, uma melodia que embala o coração e resgata histórias. João do Vale e Dona Helena Gonzaga, esposa do Rei do Baião,  em sua parceria, não apenas criaram uma música; esculpiram em versos e acordes o cotidiano de um povo e os encantos de um trem que serpenteava as entranhas do Maranhão.

Uma locomotiva arranca lentamente, como quem respeita o tempo e o espaço de quem se despede. A paisagem inicial é o retrato da vida sertaneja: casas de barro, cercas de madeira torta e o verde tímido da caatinga, sobrevivente das estiagens. Os viajantes, com suas trouxas de roupa, redes enroladas e sacolas de mantimentos, carregam não apenas objetos, mas histórias de encontros e desencontros. Cada vagão, um microcosmo de esperanças, saudades e aventuras.

O trem avanço, e as janelas revelam uma galeria de imagens vivas. Em Caxias , a morena terra de Gonçalves Dias, na primeira parada importante, o burburinho da feira livre e o aroma de farinha fresca e peixes do Itapecuru misturam-se ao calor humano. As crianças correm ao lado dos vagões, acenando para rostos que se inclinam para observar a cidade. Ali, o Brasil profundo pulsa em cada esquina, nos gestos simples e na colhida generosa.

Já em Codó , terra de magias e mistérios, o trem adentra um território onde o sobrenatural e o cotidiano se entrelaçam. As conversas nos vagões mudam de tom: alguém menciona benzedeiras famosas, enquanto outro lembra lendas que se escondem nos campos abertos. Codó, com seu cheiro de cana-de-açúcar e vozes que falam com os santos, é um ponto de encontro entre o terreno e o divino, um espelho das reflexões que moldam o imaginário popular.

No caminho, o Croatá revela o vigor das florestas de cocais e dos rios , a metáfora da piracema dos cearenses em busca de uma vida melhor. As paisagens alternam entre o verde fechado e as clareiras onde a vida brota com intensidade. É um momento de respiro, de contemplação, em que os olhos dos viajantes se perdem na vastidão, enquanto o trem desliza suave, como se também admirasse o cenário. Aqui, o silêncio é interrompido apenas pelo apito da locomotiva, um canto que se funde ao cenário natural.

Finalmente, o destino anuncia-se com a brisa do mar e o cheiro de sal: São Luís , a ilha do amor, com suas ruas de  casarões de azulejos e ladeiras que contam histórias de um tempo colonial. A chegada é um marco, um fim que é também um começo. Os passageiros descem, mas carregam consigo as marcas de uma viagem que transcendeu o físico e tocou a alma.

João do Vale, o arquiteto dessa melodia viajante, foi mais que um compositor. Foi um cronista do sertão, um poeta dos trilhos e das vidas que neles embarcaram. Suas canções não eram apenas música; eram mapas, guias sensoriais de um Nordeste que ele conhecia de cor.

Louvo-te, João do Vale, por traduzir o barulho do trem em poesia e por ensinar que cada curva no caminho guarda uma história a ser cantada. Entre Teresina e São Luís, tua voz ainda reverbera, guiando-nos pelos trilhos do coração nordestino.

Por José Casanova
Professor, Jornalista e Escritor membro da
Academia Bacabalense de Letras
Academia Mundial de Letras da Humanidade
Tutor da Academia Maranhense de Letras Infantojuvenil

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3 comentários:

  1. Como é lindo as palavras encaixada concatenadamente torna a narrativa adocicada ao paladar do leitor. Obrigado por nos proporcionar esses momentos de leitura com sua criatividade

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