Há uma alegria que chega dançando. Não bate à porta, não pede licença: entra em passos de quadrilha, com vestido de chita, chapéu de palha e um sorriso que ilumina mais do que a fogueira de São João. Em Bacabal, terra da Bacaba, essa alegria tem nome: Apaexonados do Sertão. E tem também um propósito nobre: celebrar a vida, a cultura e a inclusão de crianças e adolescentes com Síndrome de Down, que encontram na APAE mais do que apoio ,encontram pertencimento.
Para quem vê de fora, pode parecer apenas uma quadrilha junina. Mas para quem olha de verdade, é um espetáculo da humanidade. Todos os anos, quando junho se aproxima, os olhos se acendem de expectativa. Eles esperam pelo grande dia: o arraiá dos Apaexonados. Lá estão eles: o noivo e a noiva com fita no cabelo e terninho de quadrilha, Lampião e Maria Bonita com orgulho no olhar, o Padre atrapalhado, o Delegado engraçado, todos personagens de uma tradição que ultrapassa gerações.Mas há algo mais profundo por trás das roupas coloridas e da sanfona animada. Cada passo ensaiado, cada sorriso, cada abraço apertado conta a história de uma jornada marcada por descobertas, desafios e amor. A Síndrome de Down é causada por uma alteração genética, um acidente do acaso, onde há uma trissomia no cromossomo 21 ,ou seja, em vez de dois, há três cromossomos nesse par. Um pequeno detalhe no mapa genético, mas que faz toda a diferença na forma como o mundo os percebe e, sobretudo, como eles percebem o mundo.
Na APAE de Bacabal, esse "detalhe" é tratado com a delicadeza e o compromisso que merece. Ali, a ciência e o afeto caminham lado a lado. Médicos, fisioterapeutas, fonoaudiólogos, psicólogos, professores e voluntários se unem para oferecer um acompanhamento integral. Mas não é só de saúde que se constrói a dignidade ;é também de cultura, identidade e alegria.
É por isso que a quadrilha junina se tornou símbolo desse trabalho. Sob a batuta do incansável Domiguinhos Gangá, figura carismática e apaixonada pela cultura popular, os ensaios se transformam em encontros de transformação. Ele não ensina apenas a dançar: ensina a acreditar. Ensina que cada criança tem um brilho próprio, um ritmo único e uma história que merece ser celebrada de pé, com palmas, sanfona e coração.
As famílias participam de tudo. Costuram as roupas, organizam as festas, levam os filhos nos braços e no peito. Há nos olhos dos pais e das mães uma mistura de orgulho e esperança, como quem diz:
- Eles também podem.
E podem mesmo. Podem ser personagens da festa, protagonistas da própria vida, dançarinos da inclusão.
A quadrilha dos Apaexonados do Sertão é mais do que um espetáculo junino. É uma afirmação política, cultural e afetiva de que todos têm lugar no arraial da existência. No compasso da zabumba e no giro da saia, o preconceito perde o passo, e a inclusão toma o centro do terreiro .
Porque no fim das contas, a verdadeira beleza da vida está nisso: em reconhecer que somos todos diferentes, mas igualmente capazes de amar, de sonhar e —por que não? — de dançar.
JOSÉ CASANOVA
Professor, Jornalista e Escritor Membro da
Academia Bacabalense de Letras
Academia Mundial de Letras da Humanidade
Tutor da Academia Marahense de Letras Infantojuvenil










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