sexta-feira, 9 de fevereiro de 2024

CRÔNICA DO DIA: Falas do silêncio

Prefiro não dizer onde começa essa história, que me veio à cabeça como um poema chega pela inspiração ao poeta. Sei que estou numa metrópole, onde os filhos do concreto permeiam nossas rotinas diárias e noturnas, nesta selva de pedras bem projetada ,existe um som muitas vezes negligenciado: o silêncio. Não é aquele silêncio pacífico das madrugadas serenas, mas sim um silêncio carregado de solidão, de desconexão, de desespero.

Em uma rua barulhenta, onde os motores roncam e as multidões se movem em um frenesi constante, há um homem que se destaca não pelo seu alarido, mas pela ausência dele. Ele está lá todos os dias, sentado em seu banco de madeira, com os olhos perdidos no vazio e a alma sobrecarregada de histórias não contadas.

Meu faro de jornalista decidiu desvendar o enigma por trás da figura silenciosa. Seres humanos enigmáticos sempre me renderam histórias interessantes.

 Aproximei-me do homem silencioso, que está sentava em seu banco de madeira, olhando para o horizonte. Seus olhos refletiam as cores do vazio, e expressavam a aquarela do silêncio.

_Com licença, posso me sentar ao seu lado? – Perguntei ao homem, já ligando meu smartfone na intenção de gravar nossa conversa.

O Homem acenou levemente com a cabeça em consentimento.

_ Obrigado. Meu nome é Marcos, sou jornalista. Eu tenho notado você aqui todos os dias. Você se importaria de me contar um pouco sobre você?

Ele Olha-me atentamente  por um momento, avaliando-me  silenciosamente, como se desvendasse todos meus segredos e falou:

_ Eu costumava ser um poeta.

_Um poeta? Que interessante! Suas palavras chamavam atenção das pessoas, conseguia tocar muitos corações com suas poesias, não é?

_ Sim, elas costumavam. Mas isso foi há muito tempo.

_ O que aconteceu? Por que parou de escrever? – quis saber curioso

O Homem Suspira profundamente. Olha nos meus olhos e volta a olhar para o vazio.

_ Um dia, as palavras simplesmente desapareceram. Não consegui mais encontrá-las, não consegui mais pronunciá-las. – Disse o homem vestido numa camisa onde se via a imagem estampada de Fernando Pessoa.

_Isso deve ter sido difícil. Como você lida com isso agora?  - Insistir.

_Eu aprendi a encontrar paz no silêncio. Nas entrelinhas das coisas não ditas. Nos efeitos de sentidos da vida, nos pedaço indizíveis  dos poemas. – Respondeu o homem.

Agora utilizava a linguagem de um crítico literários, dava pra ver que o homem silencioso deveria ter conhecimento profundo do universo da literatura. Refletir um pouco  falei:

_ O silêncio se tornou sua voz, então?

_Talvez.  – Respondeu secamente. _O que você quer saber realmente, às vezes, é mais fácil ser ouvido quando você não está falando.

Assenti com a cabeça. Há momentos na vida que o melhor a fazer é concordar.

_Você acredita que o silêncio tem algo a nos ensinar? – Voltei a perguntar.

_ Sim, tenho certeza absoluta. O silêncio fala em volumes altos, se você estiver disposto a ouvir. – afirmou o homem.

_ Obrigado por compartilhar sua história comigo. Posso escrever sobre isso? – Perguntei num sorriso.

_ Você acha mesmo que alguém vai se interessar por isso? Não há palavras necessárias para o silêncio. Se elas puderem ajudar alguém a entender, então escreva.

Levantei do banco, agradecendo ao homem, e comecei a fazer minhas primeiras anotações  que dariam origem a essa crônica.

_Adeus, e obrigado mais uma vez.

_ Adeus, amigo. Que suas palavras encontrem o coração daqueles que precisam ouvir.- Ironizou o homem.

Sair o deixando novamente imóvel em seu silêncio contemplativo.Parte superior do formulário Descobri que aquele homem era um poeta renomado, cujas palavras costumavam tocar os corações de muitos. No entanto, em um fatídico dia, em meio ao tumulto da cidade, ele perdera a capacidade de falar. Literalmente vitima de uma depressão grave, que afetou drasticamente sua energia e motivação, levando-o à diminuição da fala e da capacidade de escrever.

Quero com essa crônica revelar como o silêncio desse homem se transformou em uma metáfora para a maneira como tantos de nós existem, aprisionados no estrondo ensurdecedor da vida moderna, incapazes de expressar verdadeiramente nossos sentimentos e emoções.

Como homem das letras, compreendo que o silêncio daquele homem não era um anátema, mas sim uma oportunidade para os outros ouvirem suas próprias vozes interiores, para se reconectarem com a essência da vida frequentemente abafada pelo tumulto ao nosso redor.

Assim, a crônica encerra-se com uma reflexão sobre a importância de encontrar momentos de silêncio em meio ao caos, de escutar as vozes que ecoam dentro de nós e de nos reconectarmos com o que verdadeiramente importa na vida. E, quem sabe, talvez descobrir a beleza no silêncio que grita, fala e sussurra.

Por José Casanova

 

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