segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

O URBANO DIVIDIDO


Após os delírios, alegorias e adereços das viagens surreais de cunho carnavalesco, não me atrevo a fazer nenhuma previsão sobre o enredo dos próximos capítulos da novela do Governo do Maranhão que serão levados ao ar na “tela da TV e no meio desse povo”.
Após as aventuras televisivas e espetacularizadas da Via Expressa, do Beija-Flor e do Maranhão Basquete, fica difícil até opinar sobre os episódios que ainda estão por vir, em se tratando de pão e circo para uma platéia ainda festiva e aparentemente desligada dos crônicos e diários problemas que acometem o nosso estado oligárquico e a nossa cidade quatrocentona.
Arrisco e assino uma proposta, antes mesmo de um palpite, da necessidade de iniciarmos uma discussão séria com todos os diversificados segmentos da sociedade ludovicence sobre os destinos da nossa querida São Luís, que tantos dizem amar; só que, apesar de tanto amor declarado, poucos gestos de afeto e apreço tem-se consolidado em termos de obras e serviços pautados num planejamento urbano, onde a dignidade humana e o Direito à Cidadepontifiquem como fundamento maior das Políticas Públicas a serem priorizadas pelos presentes e futuros governantes municipais.
Por falar em direito, relembro que em março de 2010, foi realizada no Rio de Janeiro a quinta sessão do Fórum Urbano Mundial, que teve como tema central: “Direito à Cidade – Unindo o Urbano Dividido”, evento que reuniu autoridades governamentais, lideranças comunitárias, pesquisadores e diversos tipos de organizações sociais para discutir as várias faces das desigualdades sociais que dividem, muitas vezes de modo violento e cruel, os territórios das cidades do Brasil e do Mundo.
Com toda certeza, o nosso urbano, dividido e desigual, representa no atual momento a grande chaga social que a especulação imobiliária e as equivocadas intervenções urbanísticas de grande monta vêm escancarando, feito uma ferida incurável que a cada dia sangra mais, ferindo fundo a impotência e a passividade de todos que se limitam a observar, ou até mesmo colaborar com o atual estado da arte, que só agudiza o sofrimento de uma população que pouco tem do que se orgulhar em torno dos festejos programados para os 400 anos da cidade.
Faz algum tempo, se não me engano em 1999, contribui com um texto e uma palestra para o seminário “Cultura: Planos de Governo”, promovido pelo Fórum Intermunicipal de Cultura, realizado na cidade de São Paulo; que tinha entre uma das suas principais diretrizes,“contribuir para a elaboração de Planos de Governo democráticos e participativos, sintonizados com os processos culturais locais e globais”.
Do texto, publicado posteriormente pela revista do respeitado Instituto Pólis, compartilho com os leitores desta coluna um trecho, que considero bastante atualizado e pertinente, por colocar a dignidade da pessoa humana como elemento central do debate a ser travado em torno doDireito à Cidade e do combate ao esgarçamento do tecido urbano, às vésperas de decidirmos os destinos da próxima governança do Município de São Luís:
“As pessoas estão nas cidades e as cidades nas pessoas, assim como sujeitos e objetos; ambas se reconstroem todos os dias; nas suas esquinas, becos e avenidas, feiras e praças; nas conversas das comadres, na apoteose de seus bêbados e malandros, poetas e pivetes; engendrando novas formas de convivência, compartilhando ruas e soluções urbanas; com mais ou menos doses de humanidade, conforme a inclusão/exclusão das culturas de milhões de uns, com seus cantos/desencantos, religiosidades e ateísmos conferem à paisagem coletiva tons de solidariedade e desagregação”.
“Trata-se de uma peleja ainda não acabada, às vezes nordestina, de outras transregional, rural/urbana, central/periférica. Os diálogos e as sínteses são construídos a partir dessa possibilidade de respeito e acatamento de outras identidades e pertencimentos; da construção permanente das pontes humanas: homem/homem, homem/cidade, cidade/homem, cidade/cidade.
PS. Dedico o presente artigo aos poetas, educadores, escritores e humanistas, membros do Instituto Pólis - Hamilton Faria e Valmir de Souza - que compartilharam comigo tantas pelejas em prol de um mundo solidário e responsável, a partir das conspirações poéticas em defesa das cidades.
 

 
Joãozinho Ribeiro
poeta/compositor

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