Refúgio certeiro para o ócio ou palco de criações de expoentes da literatura brasileira, as residências de grandes autores transformadas em museus democratizam o acesso a espaços tão particulares. O sentimento de união à mesa e a casa cheia durante banquetes tipicamente baianos era ritual comum na família de Jorge Amado. Os fãs do escritor podem conhecer o endereço no bairro Rio Vermelho, que passou a funcionar em 7 de novembro como casa-museu.
“Depois da morte de meu avô, as pessoas batiam à nossa porta pedindo para entrar e conhecer a casa. Não restou nenhuma dúvida da importância de abrirmos a Casa do Rio Vermelho aos inúmeros fãs dele e da esposa, Zélia Gattai”, ressalta Maria João Amado, neta dos escritores e coordenadora do espaço.
As cinzas de Jorge Amado e Zélia Gattai foram depositadas sob uma mangueira no quintal da casa, perto de um banco que recebe o colorido de mosaico de azulejos, o preferido do casal, projetado por Carybé. A antiga penteadeira de Zélia está entre o mobiliário que continua presente no quarto do casal. “Nesse espaço quase posso ver minha avó alegre e sorrindo com a realização de um sonho”, destaca Maria João.
Frequentador do cenário cultural brasileiro e grande defensor da cultura popular, Jorge Amado recebeu nomes ilustres como Simone de Beauvoir, Pablo Neruda, Roman Polanski e Jack Nicholson. “Ao passear no quintal, Jack Nicholson comeu uma jaca que quase caiu na cabeça dele. Esses e outros fatos curiosos permeiam a história dessa casa que prometi transformar em memorial no leito de morte da minha avó”, relembra, João Jorge Amado, neto do escritor e coordenador do museu.
Memória afetiva
Em frente à ponte de madeira que sobrepõe o Rio Vermelho na pacata Cidade de Goiás, a pequena casa de arquitetura vernacular portuguesa erguida no século 18 preserva as características de adobe e pau a pique, típicos das construções da terra natal da poetisa e doceira Cora Coralina. Os pequenos cômodos abrigam antigos móveis e objetos de família da escritora, como um baú de couro, a inseparável máquina de escrever e os grandes tachos de cobre que recebiam frutas e açúcar, ingredientes principais para as geleias e os doces caseiros feitos pela poetisa.
O espaço, mantido pela Associação Casa de Cora Coralina, recebe anualmente cerca de 24 mil visitantes que desejam conhecer detalhes da vida e da obra de Cora Coralina, que teve seu primeiro livro, Poemas dos becos de Goiás e estórias mais, publicado em 1965, aos 75 anos. “A casa tem um caráter familiar e não houve nenhuma alteração na estrutura original. Além de museu, também é uma casa natal, onde a escritora nasceu”, ressalta Marlene Velasco, diretora do museu Casa de Cora Coralina.
Varanda de poesias
Grande admirador dos versos de Cora, o escritor mineiro Carlos Drummond de Andrade também possui vida e obra representadas na antiga residência, em Itabira, Minas Gerais, cidade onde viveu dos 2 aos 14 anos. A jabuticabeira que sombreia a residência inspirou os versos do escritor no poema Furta-fruta: “Jabuticaba chupa-se no pé. O furto exaure-se no ato de furtar. Consciência mais leve do que asa/ Ao descer, volto de mãos vazias para casa”.
A importância do espaço na memória afetiva do escritor impulsionou a série de livros Boitempo, com 20 poesias sobre a casa, incluindo Recinto defeso, sobre a misteriosa sala de visitas que nunca era acessível aos moradores da casa, e O criador, no qual o escritor registra a confecção do jardim interno.
Apesar de não ter o mobiliário original, a Casa Azul preserva a mobília do quarto do escritor durante o período em que viveu no Rio de Janeiro. A fachada da casa ostenta um muro que é pano de fundo para obras inspiradas na vida e na obra de Drummond por artistas contemporâneos.
Pesquisa e história
A temática histórica que marcou a obra do escritor e sociólogo pernambucano Gilberto Freyre tem sua residência no tradicional bairro Apipucos, no Recife, com um acervo destinado à pesquisa. Mais de 40 mil livros podem ser encontrados na biblioteca da Casa-Museu Magdalena e Gilberto Freyre. Os cômodos bem decorados da casa construída no início do século 19 permitem uma verdadeira viagem no tempo com mobílias esculpidas em madeira de lei e uma sala de jantar com jogo de chá de prata portuguesa e painéis de azulejos portugueses fabricados entre os séculos 16 e 17.
Além do amor pela sociologia, Gilberto Freyre admirava espécies botânicas. No terreno da casa é possível conhecer o sítio ecológico batizado com o nome do escritor. Espécies botânicas de diversas partes do mundo, como Índia e China, difundidas pelos portugueses nas antigas colônias formam um conjunto que representa a diversidade ecológica do jardim, que abriga exemplares de uso medicinal, gastronômico religioso e decorativo.
A fim de tornar a visitação do espaço atrativa para todas as idades, a casa-museu elaborou uma versão em quadrinhos da obra mais famosa de Freyre, Casa grande e senzala, além de promover um tour temático durante o qual uma atriz interpreta Dona Zefa, antiga funcionária da casa, e fala sobre cada espaço da antiga residência de Freyre e os principais pontos de sua obra. “Esse passeio é uma maneira de perpetuarmos a obra de Gilberto Freyre para as próximas gerações”, destaca Manuella Falcão, gerente de relacionamento da Fundação Gilberto Freyre.
Endereços:
Casa de Drummond
(Praça Centenário, nº 116 , Centro, Itabira, Minas Gerais; telefone: 31 3835-3894), aberto de terça a sexta, das 9h às 17h, sábado e domingo, das 9h às 16h. Entrada gratuita.
Fundação Gilberto Freyre
(Rua Dois Irmãos, 320, Apipucos, Recife; telefone 81 3441-1733), aberto de segunda a sexta, das 9h às 16h. Entrada: R$ 10.
Museu Casa de Cora Coralina
(Rua Dom Cândido, 20, Centro, Cidade de Goiás, telefone 62 3371-1990), aberto de terça a sábado, das 9h às 16h45. Domingo, das 9h às 15h. Entrada: R$ 5.
Museu Casa do Rio Vermelho – Jorge Amado e Zélia Gattai
(Rua Alagoinhas, 33, Rio Vermelho, Salvador; telefone 71 3176-4200), aberto até dia 7 de dezembro: sexta, sábado e domingo, das 10h às 17h. A partir de 9 de dezembro, de terça a domingo, das 10h às 17h. Entrada: R$ 20
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